Neste domingo (30), uma delegação da Comissão Camponesa da Verdade (CCV) participou de uma audiência com o relator Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a promoção da verdade, justiça, reparação e garantias de não repetição, Bernard Duhaime, que está em visita oficial ao Brasil até o dia 07 de abril.
O encontro, que aconteceu em Brasília, teve o objetivo de apresentar dados sobre as graves violações dos direitos humanos contra camponeses durante e após a ditadura militar, além de reivindicar medidas para garantir o direito à verdade e à justiça. Foi apresentado o contexto das violações no campo e as limitações das políticas de memória para as populações que nele vivem.
Para o secretário de Política Agrária da CONTAG, Alair Luiz dos Santos, “com toda a certeza, esta audiência representou um passo importante na busca por reconhecimento e justiça para os povos do campo, da floresta e das águas que já foram atingidos pela repressão estatal e empresarial.”
A delegação foi composta pelos representantes do CCV Gilney Viana, Regina Coeli e Halyme Antunes; o assessor de Política Agrária e advogado da CONTAG, Ivo Lourenço; a neta do líder camponês desaparecido José Porfírio, Alinne Porfírio; o coordenador do Grupo Tortura Nunca Mais do Goiás (TNM-GO) e irmão do desaparecido Marco Antônio Dias Batista, Waldomiro Batista; e Fernando Alberto Lopes, também do GTNM-GO.
Depoimentos e denúncias
Gilney Viana apresentou uma síntese do relatório da CCV, destacando os camponeses como principais vítimas da repressão estatal e denunciando a exclusão sistemática desse grupo do direito à Justiça de Transição.
Regina Coeli destacou a coincidência do encontro com a memória do golpe civil-militar de 1964, a campanha "Não Anistia" relacionada aos atos golpistas de 2022/2023 e a possibilidade de o STF reavaliar a Lei de Anistia. Ela entregou ao relator um documento da CCV, que defende a reabertura de prazos para casos de camponeses desaparecidos e a aceitação de novas demandas, como no caso de Juscelino Kubitscheck.
Halyme Antunes denunciou a parceria entre o regime militar e empresas privadas na Amazônia, citando a Josapar como exemplo de violação dos direitos camponeses, e destacou a ação da CCV junto ao Ministério Público Federal, que levou à abertura de inquérito policial contra a empresa.
Ivo Lourenço resgatou o histórico da CONTAG e a perseguição sofrida por seus dirigentes após o golpe de 1964. Ele mencionou a luta pela retomada da entidade e o assassinato de líderes sindicais, como Margarida Maria Alves. Ressaltou também a iniciativa da CONTAG e da Associação dos Colonos Atingidos pela Repressão Estatal e Privada da Gleba Cidapar (PROREPARAÇÃO) de requerer, perante a Comissão de Anistia, requerimento de Anistia Coletiva, ainda não julgado.
Alinne Porfírio relatou o impacto emocional e social do desaparecimento de seu avô José Porfírio, reivindicando o direito à verdade, ao luto e à justiça.
E, para finalizar, Waldomiro Batista falou sobre o desaparecimento de seu irmão Marco Antônio Dias Batista e destacou casos de discriminação contra camponeses na Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP). Citou a negligência em relação ao assassinato de Albertino José de Farias, em 1964, cujo caso permanece sem resolução.
Encaminhamentos da ONU
Após ouvir os depoimentos, o relator especial Bernard Duhaime fez as seguintes solicitações:
Dados unificados e credíveis sobre os camponeses atingidos pela repressão.
Outras organizações que atuam na defesa da memória camponesa.
Documentação técnica sobre graves violações de direitos humanos no campo.
Casos de violações de direitos humanos no campo após a ditadura, especialmente na Amazônia.
Histórias ainda não relatadas, impactos intergeracionais e categorias de vítimas não abordadas.
O relator indicou que essas informações podem ser enviadas por e-mail até 7 de abril de 2025.
Por Malu Souza / Comunicação CONTAG