CONTAG assina Nota de Repúdio às atitudes desrespeitosas do senador Roberto Rocha (PSDB-MA) durante audiência que tratou da ampliação do Parque Nacional dos Lençoís Maranhenses.
Leia Nota abaixo na íntegra:
Nós, que estivemos presentes na Audiência Pública convocada pelo senador Roberto Rocha (PSDB-MA), no dia 1º de novembro de 2019, em Santo Amaro, Maranhão, vimos manifestar nosso repúdio às atitudes desrespeitosas por parte do parlamentar, que nos chocaram, as quais descrevemos abaixo:
1. O cerimonial do senador escolheu local impróprio para a realização da audiência, sendo um espaço quente e que não comportou o enorme número de pessoas que compareceram à reunião. Depois de muita pressão dos presentes, o cerimonial decidiu transferir a Sessão para um clube da cidade, distante da Casa do Artesanato, onde a reunião ocorreria inicialmente. Pacientemente, os presentes se dirigiram, debaixo de um sol escaldante, por volta das 11 horas, ao outro local escolhido. Aproveitaram para, no trajeto, realizar uma passeata pacífica contra o PLS 465, de autoria do senador, cantando: Parque é nosso! Não queremos que transforme em negócio, o que foi abundantemente registrado em vídeo por vários dos presentes e já está circulando na imprensa.
2. O senador só se apresentou às 11:30h, sendo que a reunião fora marcada para às 10:00h. Cabe destacar que o cerimonial não deu prioridade aos representantes sindicais e de outras instituições e entidades presentes, seguindo uma ordem aleatória de inscrição e, a cada pergunta ou posicionamento, invariavelmente contra o PLS, o parlamentar tomava a palavra e usava-a durante vários minutos. Com isto, representantes de Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, de Colônias de Pescadores, vereadores, da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG) e da Federação de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão (FETAEMA), não puderam ser ouvidos, dada a desculpa de praxe do adiantado da hora, o que provocou revolta entre os presentes. Nesse momento, o microfone foi tomado por vários deles, sem que pudessem ser ouvidos pela plateia. Aliás, o som contratado era péssimo e nem todos puderam se fazer ouvir a contento durante a audiência.
3. Durante suas intervenções, o senador repetiu à exaustão críticas infundadas ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), transformando o órgão em principal alvo de ataques: que os fiscais usavam metralhadoras; que impediam a construção de escolas; que não permitiam que os turistas levassem garrafas de água aos lugares de visitação; que criavam obstáculos às pessoas com dificuldade de locomoção para visitar o Parque; que as mães com crianças não tinham como trocar suas fraldas. Contraditoriamente com suas críticas ao órgão, ressaltou, inúmeras vezes, que o PLS 465 não é de sua autoria e, sim, de autoria do próprio Instituto Chico Mendes e que ele, senador, apenas o teria assinado. Afirmou, ainda, que o Parque não possuía Plano de Manejo e que ele, senador, estava realizando gestões para a realização desse estudo junto à Universidade Federal do Maranhão (UFMA), ali representada pelo seu então vice-reitor. Neste ponto, o senador foi contestado por um professor da área de Oceanografia da UFMA, que coordenou a equipe autora do Plano de Manejo do Parque, em 2003.
4. Em todas essas afirmações equivocadas sobre o ICMBio, o senador foi contestado, muito educadamente, pelo servidor que ali estava voluntariamente, pois, conforme explicou, estando em férias não poderia representar o órgão. Em sua réplica ao servidor do ICMBio no Parque Nacional dos Lençóis, o senador proferiu, em público, ameaças contra o técnico, afirmando que ele o chamara de mentiroso, fato que as filmagens existentes podem atestar que não ocorreu. Disse, ainda, que tomaria as devidas providências contra o servidor, assim que chegasse a Brasília. Uma pergunta que fica é: por que o chefe do Parque não foi convidado pelo senador para comparecer à audiência e sim um servidor em férias?
5. Além do servidor, o senador também agrediu verbalmente um dos trabalhadores que se manifestou contra o PLS, perguntando-lhe, em tom de chacota, se ele queria uma caneta azul para cantar. Vários dos presentes, companheiros do trabalhador, sentiram-se desrespeitados com o tratamento que o parlamentar deu ao trabalhador. Essa atitude desrespeitosa e não ética foi igualmente criticada por uma dos vereadores presentes, lamentando o fato de o episódio ter sido protagonizado por um senador da República.
6. A equipe de estudiosos da UFMA, que realizou apreciação técnica sobre o projeto de lei foi impedida pelo cerimonial de apresentá-la ao público, embora autoridades do município de Santo Amaro tenham feito esta solicitação um dia antes da audiência. Neste caso, os professores coordenadores da equipe, constituída por antropólogos, biólogos, especialistas em geoprocessamento e advogados, se inscreveram e tentaram expor algumas das apreciações críticas ao projeto, mas o cerimonial os pressionava, pedindo o microfone, fato que impediu que completassem seu raciocínio.
7. Além disso, o senador afirmou que o estudo dos pesquisadores da UFMA não representava a posição desta instituição, constituindo apenas opinião pessoal dos estudiosos e que nem ele e nem a Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado tinham conhecimento do trabalho. Ora, os coordenadores da equipe estão vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais e ao Grupo de Estudos Rurais e Urbanos (plataforma Lattes do CNPq) da UFMA e realizaram o estudo, oficialmente, a pedido da Federação de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão (FETAEMA). O conteúdo da informação técnica sobre o PLS 465, elaborado por mestres e doutores em suas respectivas áreas de conhecimento, está respaldado em critérios científicos e metodológicos e não em opiniões, como sugere o senador, tendo sido apresentado na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado, em maio deste ano, em audiência à qual o senador esteve presente.
8. Finalmente, causou espanto em todos os presentes o senador admitir que possui terreno na sede do município e que pretende adquirir outros, configurando interesse particular na região onde pretende intervir com o seu projeto de lei. Aliás, há denúncias, a serem investigadas, de compra de terras pelo parlamentar em Betânia, Santo Amaro, local que, segundo seu projeto, deve ficar fora do perímetro do Parque. Algumas dessas denúncias, com depoimentos de nativos do Parque, estão gravados em vídeo.
9. Consideramos desrespeitosas e autoritárias as atitudes do senador que, demonstrou não desejar dialogar com a sociedade sobre o seu projeto, o que em parte explica a reação extremamente negativa de representantes da população tradicional do Parque Nacional dos Lençóis e da população dos três municípios envolvidos (Santo Amaro, Primeira Cruz e Barreirinhas).
São Luís, 5 de novembro de 2019.
Assinam a Nota:
Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG)
Federação de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão (FETAEMA)
Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Barreirinhas/MA
Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santo Amaro/MA
Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Primeira Cruz/MA Colônia de Pescadores de Barreirinhas / MA
Associação dos Produtores Rurais do povoado Tratada de Cima, Barreirinhas/MA
Associação Para o Progresso de Atins, Barreirinhas/ MA
Grupo de Estudos Rurais e Urbanos do Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais da UFMA FONTE: Organizações sindicais e sociais em defesa das comunidades rurais que vivem no Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses