Organizações de agricultura familiar, governos latinos e agências internacionais estiveram reunidas nesta semana em Santiago, no Chile, para um grande debate político sobre as diferentes demandas que constituem o Plano Global de Ação da Década da Agricultura Familiar - campanha iniciada em 2019 pela Organização das Nações Unidas. Mais especificamente, sobre a constituição e implementação de um Plano Regional direcionado ao continente latino.
Os diálogos aconteceram em três instâncias: a 37ª Reunião Especializada da Agricultura Familiar do Mercosul (REAF), ocorrida nos dias 5 e 6 de dezembro, o Encontro Latino-americano e Caribenho da Década da Agricultura Familiar, celebrado em 6 e 7, e a reunião da Confederação das Organizações de Produtores Familiares do Mercosul Ampliado (COPROFAM), organização de caráter regional presidida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), que abriu a programação em Santiago com o encontro de seus diretores no dia 4.
A CONTAG não poderia deixar de participar das fundamentais discussões que ocorreram nestes espaços, que além de gerar articulações e negociações políticas importantes com os governos e agências internacionais de cooperação, também possibilitam o intercâmbio de informações e experiências com outras organizações que representam a Agricultura Familiar em seus países.
O foco dos trabalhos de todas as atividades foi o cenário da Agricultura Familiar da região da América do Sul e Caribe e seu potencial, mas também seus desafios, para construir um setor fortalecido econômica e socialmente, com apoio de políticas públicas específicas para os agricultores e agricultoras e dos planejamentos estratégicos da Década. A CONTAG enviou três representantes da sua Diretoria para serem mensageiros das propostas do Brasil para essa construção conjunta para impulsionamento da Agricultura Familiar latina: o presidente Aristides Santos, o vice-presidente e secretário de Relações Internacionais, Alberto Broch, e a secretária de Mulheres, Mazé Morais.
“Em oportunidades como essas, levamos para o âmbito regional tudo aquilo que debatemos internamente com nossas Federações e Sindicatos sobre os temas importantes para a agricultura familiar brasileira, que acabam se mostrando relevantes para a agricultura de outros países também”, explica Alberto Broch.
REAF comprometida em impulsionar o Plano Regional da Década da Agricultura Familiar
Na edição anterior da REAF, ocorrida no Paraguai em junho deste ano, foi oficializado que a Reunião será um espaço central para a construção do Plano Regional de implementação da Década. Desde então os trabalhos desenvolvidos nesta instância têm sido voltados às propostas que dialoguam com os sete pilares fundamentais da Década, que falam essencialmente sobre a valorização dos sujeitos do campo, sobre fortalecimento das organizações, resiliência da agricultura familiar às mudanças climáticas, entre outras abordagens importantes para todo o contexto da produção familiar.
Nesta 37ª REAF, onde participaram comitivas do Brasil, Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile, Peru, Bolívia e Colômbia, foi dado segmento ao que já havia sido iniciado, mas com caráter de urgência nos discursos das organizações participantes, pois nota-se que pouco tem avançado nos países com a Década para seu terceiro ano de implementação. Nesse sentido, as apresentações e reuniões dos dois dias de evento buscaram indicações das organizações presentes sobre as prioridades que precisam ser levadas em conta pelos governos neste momento.
Os diálogos resultaram em alguns temas, que foram destacados na Carta de Santiago - documento que resume os pontos tratados. Entre eles estão a necessidade de mais orçamento para a Agricultura Familiar, de incentivo à inovação, de acesso à Assistência Técnica e Extensão Rural, apoio à comercialização, entre outros. O documento pode ser lido na íntegra no site da COPROFAM (em espanhol): AQUI
24 países latinos buscando segmento para a Década
Já o Encontro Latinoamericano e Caribenho da Década da Agricultura Familiar, promovido pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), reuniu um número maior de países latinos para debater em uma perspectiva regional mais ampla as metas propostas pela Década.
Ao longo dos dois dias de jornada, o público composto por dirigentes das organizações de agricultura familiar em sua diversidade de setores, por ministros e referentes de governos e de outras agências internacionais como FIDA e IICA, acompanhou painéis temáticos sobre mudanças climáticas, desigualdade territorial, participação das mulheres e da juventude nas políticas públicas para a agricultura familiar, entre outros temas que atravessam a Década. E puderam também se inteirar dos dados mais recentes das problemáticas que aumentaram na região com a pandemia, como a fome e desigualdade social.
Alberto Broch teve a oportunidade de discursar para os presentes, e criticou fortemente o mapa da fome que se vê no continente hoje, mencionando o apoio governamental para a agricultura familiar como fundamental para superar esse triste problema. “A falta de investimentos e apoio à agricultura familiar resulta em escassez de alimentos, especulação de preços para o consumidor e aumento da inflação, afetando fortemente a população mais pobre. É necessário que os governos revejam suas políticas agrícolas e agrárias, com o objetivo de corrigir as graves distorções geradas pela concentração de terra e água, desigualdade social no meio rural, violência e degradação ambiental sob o pretexto de produzir commodities para exportação”, afirmou o dirigente.
O encontro se encerrou no dia 7 com a leitura de uma declaração que resume as colocações importantes da atividade. Para Aristides Veras, que acompanhou todos os painéis, o desafio é grande, mas a articulação dos setores é uma forma positiva de enfrentá-los. “É muito importante a CONTAG estar aqui, se aproximando e interagindo com todas essas instituições. Nesse mundo globalizado é necessário buscar aliados para fazer frente aos desafios. Infelizmente ainda há pouco investimento nas demandas da agricultura familiar e poucos exemplos de políticas públicas de grande impacto. Mas em ambientes como esse podemos tentar sensibilizar os governos sobre a importância desses investimentos”, afirmou o presidente da CONTAG.
Para Mazé a experiência internacional também foi positiva. “Vimos aqui painéis muito ricos de informação, que nos mostram que cada vez mais precisamos estar organizados, resistindo e protegendo nossos territórios, enquanto buscamos formas de acabar com as desigualdades que ainda assolam a zona rural do nosso país e dos outros do continente”.
Mazé também teve papel fundamental na visita da CONTAG a Santiago, ao levar a mensagem da 7ª Marcha das Margaridas e do 4ª Festival Nacional da Juventude Rural para as reuniões, aproveitando para convidar as organizações presentes para participarem dessas atividades. Em especial as oito organizações que dividem a Diretoria da COPROFAM com a CONTAG, e que já estiveram na Marcha passada. “Pra nós é sempre uma alegria grande ter as companheiras e companheiros de organizações de outros países. Percebo que quando as dirigentes escutam sobre a Marcha ficam muito animadas para conhecer e participar conosco”, conta.
Além das mulheres agricultoras brasileiras, a dirigente da CONTAG também representou a juventude rural na reunião específica desse grupo, ocorrida no âmbito do Encontro Latino-americano, que promoveu um ótimo intercâmbio entre jovens de diversas nacionalidades. “Foi uma boa oportunidade de falar do Festival da Juventude e dos diálogos que promovemos no Brasil sobre a sucessão rural, fazendo nossas contribuições para a carta escrita em conjunto”. A carta que Mazé menciona é uma mensagem dos jovens, onde eles pedem, entre outras coisas, por mais inclusão da juventude nos espaços de diálogo político.
Fonte: Comunicação COPROFAM - Gabriela Ávila