Com Willian Clementino, vice-presidente e secretário de Relações Internacionais da CONTAG
“Há que construir consciência social sobre a origem dos alimentos”
O vice-presidente e secretário de Relações Internacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), Willian Clementino, celebrou a realização do primeiro Congresso de Assalariados e Assalariadas Rurais e fundação da CONTAR.
Em diálogo com a Rel-UITA, Willian, analisou também a necessidade de uma mudança de modelo de produção e, sobretudo, uma mudança cultural no modo de consumo dos alimentos.
UITA-Como avalia este primeiro Congresso e a criação da Confederação Nacional de Trabalhadores Assalariados e Assalariados Rurais (CONTAR)?
Willian Clementino- Minha avaliação é muito positiva porque constituímos uma organização de alcance nacional que velará pelos interesses dos assalariados e assalariadas rurais, e que vai além da defesa dos direitos laborais.
A CONTAR tentará fomentar políticas públicas que melhorem não só as condições salariais deste coletivo, mas também, seu acesso aos sistemas de educação e saúde de boa qualidade.
Estas duas áreas são as mais precárias, portanto as que devemos prestar mais atenção. Considero também que a CONTAR terá que mediar a relação entre os trabalhadores e trabalhadoras rurais e agricultores e agricultoras familiares com os demais segmentos da sociedade.
UITA-Seria um erro manter a organização dos trabalhadores rurais isolada do resto dos coletivos e setores da produção?
Willian Clementino- Sim, seria um erro. Desde a criação da CONTAG estamos juntos aos assalariados e assalariadas rurais e aos agricultores e agricultoras familiares. A nova conjuntura parece estar nos separando, na realidade está fortalecendo o trabalho em comum.
CONTAR será uma grande Confederação que se somará à causa da CONTAG.
UITA- A Conferência Nacional sobre Segurança Alimentar também aparece como um eixo importante?
Willian Clementino- Sim. Este espaço é aberto à sociedade civil para reflexionar sobre a alimentação dos brasileiros e brasileiras sob o lema “Comida de verdade, no campo e na cidade”.
É um lema com o qual, eu pessoalmente, discordo. Na verdade, o que o Brasil e o mundo demandam não é “comida de verdade” senão uma alimentação de qualidade, nutritiva.
De todas as formas é muito importante o conteúdo e a estratégia de debate desta conferência, organizada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), entidade muito respeitada pela relevância das suas políticas e pelo exemplo que é para outras organizações dentro e fora do Brasil.
Um modelo inviável a longo prazo
UITA- Os agricultores e os camponeses terão que rever a utilização dos venenos que muitos chamam agroquímicos e que, sem dúvida, são altamente prejudiciais para a saúde humana e da terra e cursos d’água.
Willian Clementino- Devemos considerar, obviamente, que os agricultores e agricultoras familiares ou os pequenos agricultores e agricultoras que utilizam agrotóxicos têm sido pressionados para fazê-lo. Existe uma grande pressão do próprio setor agrícola e até do Estado para que se incremente a produção a qualquer custo.
Os programas estatais como o Pronaf, que supostamente promovem o desenvolvimento da agricultura familiar, também com os créditos que proporcionam, marcam como, quando e onde devem os agricultores e agricultoras comprar os insumos para o cultivo.
Isso é lamentável, porque os agricultores perdem soberania
O impacto deste modelo é muito negativo para a saúde, para o ambiente, entre outras coisas. Existem dados de que cada brasileiro consome em média cinco litros de agrotóxicos por ano.
O índice de doentes de câncer é altíssimo, mas não se fazem pesquisas sobre o tema porque as grandes corporações do agronegócio incidem diretamente pela pressão financeira para que se mantenha a ignorância sobre o tema.
Selo de qualidade
Aprender a diferenciar o bom do ruim
UITA- O vínculo na relação entre a cidade e o campo pode ser o consumo de alimentos saudáveis?
Willian Clementino- Sem dúvida. É necessário dialogar e pôr sobre o tapete este assunto. Sobretudo com a população urbana, é preciso conhecer quem produz os alimentos e em quais condições isto é realizado.
Atualmente, estamos lutando para que a produção da agricultura familiar tenha um selo diferenciado, para que os consumidores saibam que atrás desse alimento existe um modelo de produção que respeita o meio ambiente e as relações laborais diferenciadas, o conjunto da família, que produz os alimentos sob certos padrões de qualidade, e de forma coletiva.
Temos que construir consciência social sobre a origem dos alimentos, começando com as crianças.
Já é tempo de começar esta reconstrução.
FONTE: Secretário Regional da América Latina da UITA, Gerardo Iglesias com revisão da Assessoria de Comunicação da CONTAG- Barack Fernandes