Numa conjuntura de crescimento do número de casos de violência contra as mulheres, vemos os poderes do Estado brasileiro atuarem na contramão da superação destas práticas sexistas e desumanas. Prova disso, foi a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição 181/2015 na Comissão Especial, a partir de texto Substitutivo.
O texto Substitutivo da PEC 181/2015, proposto pelo seu relator, o deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM/SP), estabelece as bases legais para a proibição do aborto, inclusive nos casos já previstos pela Constituição Federal, que se aplicam às situações de estupro, de riscos à vida da gestante ou de fetos anencéfalos.
Sendo parte de uma das manobras articuladas pelo deputado cassado Eduardo Cunha, quando esteve à frente da Presidência da Câmara, o conteúdo do texto Substitutivo revela a evidente tentativa de confundir a sociedade brasileira. Em sua redação original, a PEC 181/2015 tratava exclusivamente da ampliação do período da licença maternidade às mães de crianças prematuras, tema este de grande relevância, por resguardar às mulheres trabalhadoras o direito ao seu posto de trabalho e por promover qualidade de vida para a mãe e o bebê. Ao incluir neste substitutivo um tema que extrapola a discussão central desta matéria legislativa, os parlamentares querem não só confundir a população, como restringir o debate e desviar a atenção sobre a real intenção do texto, que é a de criminalizar as mulheres.
Esta PEC é uma das expressões mais cruéis e violentas vinda do Estado sobre os corpos e a vida das mulheres brasileiras. Por meio dela, se reproduz a visão de que a vida das mulheres não tem importância, além disso, impõe-se às mulheres vítimas do estupro uma dupla punição: a de conviver com os traumas deixados pelo abuso sexual e a obrigação de manter uma gestação decorrente de uma experiência de violência, seguindo sem o apoio do mesmo Estado que hoje decide com intransigência os rumos das suas vidas. Da forma com que se expressa, esta PEC pode, inclusive, colocar sob suspeita as mulheres que vivenciam situações de aborto espontâneo, desamparando-as e criminalizando-as.
Quanto ao impacto desta pauta para a agenda nacional, é possível perceber na argumentação dos parlamentares favoráveis à PEC uma abordagem que privilegia enfoques de ordem moral, deixando de pautar o tema do aborto na sua relação com as questões da saúde pública. Por este caminho, desconsideram-se os variados casos de danos à saúde e, até mesmo, de morte de mulheres, especialmente as mais pobres, decorrentes de procedimentos de abortamento realizados em péssimas condições.
O placar da votação – realizada no dia 08 de novembro de 2017, pela Comissão Especial criada para tratar desta matéria – mostrou que todos os deputados homens presentes votaram a favor do Substitutivo, evidenciando todo o machismo e desrespeito destes parlamentares aos direitos e à vida das mulheres. Foram 18 votos vindos de deputados homens, que jamais passarão por uma experiência de violência sexista, nem tampouco sofrerão o drama de ter suas vidas ameaçadas, diante de uma gestação de risco. Vale enfatizar que o voto contrário veio da única mulher presente, a deputada Érica Kokay (PT-DF), que buscou exaustivamente desvincular os temas apresentados pelo Substitutivo. Continuamos mobilizadas para garantir nesta terça-feira (21) a votação dos destaques ao texto pela Comissão Especial. Precisamos reverter os prejuízos gerados a partir do conteúdo do relatório aprovado.
Após esta votação, a matéria segue para o Plenário da Câmara, onde deverá ser votada em dois turnos, sendo necessários 308 votos favoráveis ao substitutivo para sua aprovação. Como a origem da PEC é do Senado Federal e houve alteração em seu texto original, caso o substitutivo seja aprovado, a PEC retornará ao Senado Federal para que a mudança seja analisada pelos senadores.
Diante destes argumentos, a CONTAG manifesta sua contrariedade ao texto Substitutivo à PEC 181/2015 e a todos os projetos legislativos que visem criminalizar as mulheres brasileiras. Convocamos todas as FETAGs a, junto conosco, pautarem os parlamentares de forma a barrarmos mais este retrocesso, que afeta o direito a uma vida digna e autônoma às mulheres e que também impacta sobre toda a sociedade brasileira.
A CONTAG reafirma o seu compromisso com a luta em favor da justiça social, que passa necessariamente por relações de gênero igualitárias, onde as mulheres possam decidir com autonomia sobre sua vida e seus corpos, livres de todas as formas de violência, principalmente as fundadas nas desigualdades de natureza sexista, racista, de classe e orientação sexual. FONTE: Secretaria de Mulheres da CONTAG