Representantes do governo federal e dos trabalhadores e trabalhadoras rurais concordam que quanto mais lento é o processo de regularização fundiária, mais aumenta o número de áreas ocupadas e, consequentemente, pioram os conflitos agrários. O assunto foi discutido em audiência pública da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara. Pará e Rondônia foram citados como os estados onde os conflitos são mais graves atualmente.
O diretor do Departamento de Caracterização e Incorporação do Patrimônio, do Ministério do Planejamento, Antônio Roberto Ferreira, resumiu os benefícios da titulação definitiva de terras. "A regularização é a garantia para o setor produtivo ter acesso a financiamentos e ter condição de melhorar a qualidade da produção", disse.
O superintendente da Subsecretaria Extraordinária de Regularização Fundiária na Amazônia Legal, da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, José Dumont Teixeira, apresentou as metas do programa Terra Legal, que regulariza a situação de ocupantes de áreas públicas: pouco mais de 5 mil títulos entregues até o final deste ano e 15 mil até o final de 2018. Ele reconheceu que o andamento dos processos precisa avançar, mas informou que isso depende da ampliação do orçamento e do quadro de pessoal.
O diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Incra, no Distrito Federal, Rogério Arantes, reconheceu as dificuldades orçamentárias, que atingem, principalmente, a área de recursos humanos. "A gente tem tido concursos esporádicos, mas não é suficiente para suprir o número de pessoas que vêm se aposentando”, afirmou.
Arantes informou que está em andamento uma licitação para contratar serviços de georreferenciamento em todos os estados do país. O georreferenciamento é o levantamento topográfico da área rural e uma das condições para a entrega dos títulos definitivos de propriedade. O técnico do Incra também sugeriu que as bancadas dos estados da Amazônia na Câmara se mobilizem para destinar recursos para a regularização fundiária.
PARTICIPAÇÃO DA CONTAG
O secretário de Formação e Organização Sindical da Contag, Guto Silva, foi um dos debatedores desta Audiência Pública. “Ao invés de apresentar um planejamento, seguimos a nossa característica enquanto movimento sindical de fazer um debate provocativo. Para se discutir regularização fundiária na Amazônia, primeiro é preciso conhecer de perto a Amazônia. Por isso, eu fiz uma contextualização de que a Amazônia, durante muitos anos, teve uma perspectiva, uma proposta de desenvolvimento voltada a ser um celeiro do mundo, e uma política agropecuária, energética e de mineração de total contrassenso com a questão ambiental, com foco na devastação ambiental, da ocupação de terras indígenas e territórios quilombolas”, explicou o secretário.
Guto destacou que, além dessa visão conservadora de desenvolvimento, a violência no campo e os conflitos fundiários têm aumentado assustadoramente. “Infelizmente, segundo dados da CPT, de janeiro a julho deste ano, foram assassinadas 66 pessoas, dentre essas, boa parte era dos estados do Maranhão, Rondônia e Pará e com o agravante de alguns casos se tratarem de chacinas. Essa ausência do Estado é que também provoca o acirramento dos conflitos por terra.”
O dirigente também criticou a forma como as políticas públicas voltadas para a Amazônia são pensadas. “É preciso ter sensibilidade de pensar políticas diferenciadas para esta região no sentido de perceber uma forma de uma ocupação diferente, uma população diferente. Para isso, é preciso ter políticas públicas diferentes.”
O dirigente destacou, ainda, o corte drástico no orçamento de alguns programas ligados à reforma agrária, nos últimos três anos. “Vemos o sucateamento do Incra ao longo dos últimos anos. Aumentam as demandas, mas faltam concursos, falta estrutura administrativa e recursos para realizar a reforma agrária e acompanhar os assentamentos da reforma agrária. A proposta orçamentária do governo para 2018 mostra que haverá um grande retrocesso na política de reforma agrária, Pronera, demarcação das terras indígenas e de territórios quilombolas, que aumentarão os conflitos fundiários na Amazônia. Para obtenção de terras, por exemplo, o corte será superior a 86% em relação ao orçado para 2017.” Guto também criticou a decisão do governo de fazer a seleção de beneficiários para a reforma agrária via edital, que visa enfraquecer a luta do movimento sindical e dos movimentos sociais pela democratização da terra.
Para lutar contra esse orçamento e tentar uma recomposição de recursos para avançar nas políticas, a CONTAG, as Federações e Sindicatos, em conjunto com as organizações do Campo Unitário, irão realizar uma série de atos e de articulação junto aos deputados e deputadas visando resolver a questão orçamentária e evitar mais retrocessos para a população rural.
O deputado Lucio Mosquini (PMDB-RO), que propôs a realização do debate, defendeu melhor condução do processo de regularização fundiária na Amazônia Legal. "Quando o governo entender que o incentivo da documentação é uma solução para os conflitos agrários, nós vamos melhorar as condições de vida das pessoas da Amazônia Legal. Agora, o que falta hoje? É o governo encarar isso, encarar com seriedade, encarar como prioridade", argumentou. FONTE: Agência Câmara - Claudio Ferreira, com edição e informações da Assessoria de Comunicação da CONTAG Verônica Tozzi.