Dados analisados no estudo realizado pela CONTAG “Previdência Social Rural: Potencialidades e Desafios” apontam que não há déficit na Previdência Social, integrada ao sistema de Seguridade Social. Os dados vêm de estudos do (IPEA), do (Dieese) e da Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal (Anfip), que analisaram dados da Previdência Social, da Receita Federal, do IBGE, de estudos acadêmicos e diversas outras fontes de pesquisa, que trouxeram questões técnicas e números atualizados sobre a Seguridade Social do Brasil. O estudo foi lançado na manhã de hoje (7) durante seminário realizado na sede da CONTAG, em Brasília. O conteúdo completo do estudo você pode ver aqui.
Setores do governo que alegam a necessidade de ajustes que prejudicam os trabalhadores e trabalhadoras, especialmente os rurais, trabalham apenas com a conta simplificada de Receitas previdenciárias menos Custos com Benefícios - um dos dados mais divulgados é que em 2015 a receita da Previdência Social foi de R$ 350 bilhões, enquanto foram pagos R$ 436 bilhões, resultando em um suposto déficit de quase R$ 86 bilhões.
Mas é preciso saber que a Seguridade Social é custeada por recursos dos orçamentos da União, de estados e municípios, e das contribuições sociais – a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Confins), a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL), a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS/PASEP) e também de receita de concursos e prognósticos (jogos de loteria). No entanto, a renda total da Seguridade Social é drenada pelo desvio (previsto na Constituição) de 20% da Desvinculação de Recursos da União (DRU), das desonerações da folha de pagamentos de vários setores da economia, e da sonegação de impostos. Se contarmos com todas as fontes de recursos que devem ser destinados para garantir a execução dos direitos dos cidadãos brasileiros previstos na Constituição Federal de 1988, a Seguridade Social é superavitária.
As desonerações da receita da Seguridade Social entre 2007 e 2015 somam R$ 715 bilhões. Somados à previsão de R$ 142 bilhões para 2016, o total chega a R$ 857 bilhões. Além disso, os dados consolidados apontam que, entre 2008 e 2014, foram desvinculados por meio da Desvinculação de Recursos da União (DRU) quase R$ 270 bilhões.
É preciso chamar a atenção também para a imunidade concedida ao agronegócio exportador. Entre 2009 e 2014, a Seguridade Social deixou de arrecadar R$ 19,9 bilhões devido à desoneração de exportação da produção rural feitas por pessoas jurídicas. As estimativas para 2015 e para 2016 apontam para a cifra de R$ 11,8 bilhões. Essa informação é importante quando aliada ao fato de que os produtores rurais pessoas físicas – o segurado especial – estes sim contribuem para a Previdência Social com 2,1% do valor de cada venda de sua produção. No entanto, o repasse dessa arrecadação deve ser feito pela empresa que comprou os produtos, e, devido à falta de controle não é possível acompanhar a real destinação desses recursos. A CONTAG luta há pelo menos uma década pela efetivação do Cadastro do Segurado Especial junto ao INSS, que dará a possibilidade do governo rastrear o quanto os trabalhadores rurais pagam e quanto é efetivamente repassado para o Estado. Afirmar que os trabalhadores e trabalhadoras rurais não contribuem para a Previdência Social é uma distorção das informações.
A sonegação de impostos e a inadimplência são responsáveis ainda pelo déficit de R$ 35 bilhões somente em 2016. Se somarmos aos quase R$ 375 bilhões inscritos na dívida ativa da União, chegamos a uma perda de arrecadação enorme, quatro vezes maior que o suposto “déficit” registrado pelo (Regime Geral da Previdência Social (RGPS) em 2015.
A questão da idade mínima
Os impactos de uma Reforma da Previdência que modifique a idade mínima para os trabalhadores(as) rurais serão muito graves. Historicamente sabemos que, no campo brasileiro, o trabalho começa muito cedo. Estudos do IPEA apontam que, ainda em 2014, 70% das mulheres e 78% dos homens começaram a trabalhar antes dos 14 anos de idade. Atualmente, a idade mínima para a aposentadoria de mulheres rurais é de 55 anos e a de homens é de 60 anos. São, em média, mais de 40 anos trabalhando para, na fase final da vida, ganhar um salário mínimo. É preciso levar em consideração ainda as condições duras, e muitas vezes degradantes do trabalho rural, muito diferentes da maior parte das profissões urbanas.
É preciso considerar ainda a questão cultural de gênero, que aponta que a mulher rural tem muitas vezes três turnos de trabalho: na produção agrícola, o trabalho doméstico e o cuidado dos filhos ou de pais e parentes idosos(as). Baseados nos números na Previdência Social do término de recebimento dos benefícios, o IPEA apurou que as mulheres rurais vivem, em média, seis anos a menos que as mulheres urbanas e cinco anos a menos que o homem urbano e o próprio homem rural.
Por isso, a ideia de igualar a idade mínima de aposentadoria entre homens e mulheres rurais e urbanos para 65 anos, como se aponta nas discussões governamentais sobre o tema, é desconsiderar questões sociais básicas e diferenças entre as condições de trabalho das diferentes categorias profissionais. Os dados do IBGE apontam para o envelhecimento da população e o aumento na expectativa de vida da população, o que efetivamente demandará mudanças no sistema de distribuição de benefícios. Mas é preciso considerar também a existência de categorias profissionais que recebem benefícios muito maiores que o salário mínimo e que se aposentam com valores integrais, além de outros benefícios vitalícios que podem ser reavaliados, mas não são postos em discussão. É preciso rever a política que vê o dinheiro utilizado com a parte mais pobre da população apenas como custo, e não como investimento no desenvolvimento do Brasil.
Importância dos benefícios da previdência para a economia nacional
Em cerca de 71% dos municípios brasileiros os valores transferidos pelos benefícios da Previdência Social são maiores que aqueles repassados pelo Fundo de Participação dos Municípios. As aposentadorias e benefícios são fundamentais para movimentar a economia do País e também significam uma poderosa política de redistribuição de renda – 68% dos benefícios da Previdência Social são destinados a municípios com até 50 mil habitantes.
A desvinculação dos benefícios da Previdência Social ao salário mínimo também tem grande impacto na economia dos munícipios, mas, principalmente na redução da pobreza e da desigualdade de renda. A vinculação foi realizada em 1998, e, juntamente com as políticas de valorização do salário mínimo realizadas a partir de 2003, tiveram como consequência a redução do percentual de pobreza de 52,9% da população em 2003 para 24,2% em 2014. A desvinculação do valor dos benefícios previdenciários em relação à valorização real do salário Mínimo tronará o sistema previdenciário muito menos eficiente na função de combate à pobreza e a desigualdade de renda, aumentando o contingente da população pobre na área rural.
Permanência no campo e garantia de saúde
Para o assessor de Políticas Sociais da CONTAG e um dos coordenadores do estudo, Evandro Morello, a reforma da Previdência tal como delineada pelos atuais interesses econômicos desestimula a permanência dos jovens no campo, um desafio para a sucessão rural, determinante para o fortalecimento da agricultura familiar no Brasil hoje e no futuro. “A agricultura familiar tem papel fundamental na segurança e soberania alimentar na sociedade, e a garantia da Previdência Social é um fator importante para que o êxodo de jovens para as cidades não se intensifique ainda mais”, afirmou Morello.
O especialista apontou que as propostas de Reforma da Previdência que já são discutidas desde o governo de Dilma Rousseff não consideram a questão da luta contra a sonegação fiscal e as legislações que tramitam no Congresso Nacional para beneficiar os sonegadores. “Além disso, quando foram aprovadas as propostas de desoneração de empresas, não foram criadas contrapartidas, como a manutenção de empregos. A desvinculação de receitas da DRU é de 20%, mas a PEC 004/2015 quer aumentar esse percentual para 30%. Uma maior desvinculação será justificativa para mais cortes, que não seriam necessários”, afirma Evandro Morello.
Ele aponta ainda a importância de investir em políticas preventivas de saúde. “Hoje 18% das aposentadorias são por invalidez. São mais de R$ 40 bilhões gastos com esse tipo de aposentadoria. Isso significa que não há investimento em saúde preventiva nem em seguranças do trabalho. Além disso, mais de 50% dos pedidos de benefícios do INSS são de auxilio doença, que representam também um gasto enorme com o sistema de Previdência Social. Empresas e governos municipais, estaduais e federal precisam investir em prevenção, que sai muito mais barato do que gastar com trabalhadores que perdem sua capacidade de trabalho devido a péssimas condições de trabalho e de vida”, argumenta. Morello destaca que são necessárias políticas de reabilitação profissional para reintegrar ao mercado de trabalho as pessoas afastadas por incapacidade, medida importante em um contexto de reavaliação das contas da Previdência Social.
Luta firme pela garantia de direitos
Para o presidente da CONTAG, Alberto Broch, é necessário debater as reformas, mas é importante ter dados para garantir que os trabalhadores e trabalhadoras rurais não paguem a conta dos reajustes, especialmente se existem diversos meios de equilibrar paulatinamente as contas. “Nós temos uma grande responsabilidade de resistência e insistência nessa luta, porque nela estão envolvidas grandes conquistas. A Previdência Social tem quase 100 anos e é a primeira vez que se acaba com o ministério da Previdência e o colocam dentro do Ministério da Fazenda, encarando o tema como uma questão meramente matemática. Estamos atentos a esse grande perigo e fizemos, no dia 16 de junho, grandes mobilizações, paramos dois ministérios porque não aceitamos a perda de direitos nem a perda dos dois ministérios do Desenvolvimento Agrário nem o da Previdência”, afirma Alberto Broch.
O secretário de Políticas Sociais da CONTAG, José Wilson Gonçalves, apontou a importância do estudo para dar subsídios para a luta não apenas para o Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais nos municípios e estados, mas também para todos os movimentos de defesa dos trabalhadores, e instituições da sociedade civil. “Nos debruçamos sobre muitos estudos e dados para que nossos argumentos contra a Reforma da Previdência que se desenha sejam fortes e impeçam a perda de direitos dos agricultores e agricultoras brasileiros, e ampliem e fortaleça as políticas públicas que garantam mais qualidade de vida para todos (as) eles(as)”, afirma José Wilson.
Além dos especialistas que participaram do estudo - Marcelo Galiza, do IPEA, e do assessor da secretaria de Políticas Sociais da CONTAG, Evandro Morello - o seminário contou com a presença da diretoria da CONTAG, de diretores das Federações de Trabalhadores Rurais do Distrito Federal, de Goiás e de Rondônia, do vice-presidente de assuntos da seguridade social da Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal (Anfip), Décio Bruno Lopes, do ouvidor geral da Previdência Social, do coordenador da Frente Parlamentar da Previdência Rural, deputado Elvino Bohn Gass (PT-RS), do coordenador da Frente Parlamentar Mista da Previdência Social, deputado Assis do Couto (PDT-PR), de representante da coordenação da Frente Parlamentar da Agricultura Familiar, da vice-presidente da CUT, Carmen Foro, da secretária dos rurais da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Maria Silvana Moura, além de representantes de movimentos sociais como MAB, MMC, MMLT, e outros. FONTE: Assessoria de Comunicação CONTAG - Lívia Barreto