Valores contrariam discurso do governo Lula, que afirma dispensar tanta atenção à revitalização do rio quanto às obras para deslocar águas
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Apesar de o Orçamento da União deste ano ter autorizado gastos 80% maiores com a recuperação da bacia do rio São Francisco, a obra da transposição consumiu três vezes mais recursos públicos até quinta-feira. A mais cara obra do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) bancada com dinheiro dos tributos já consumiu R$ 370 milhões.
O Siafi (sistema informatizado de acompanhamento de gastos federais) mostra pagamentos de R$ 186 milhões na transposição em 2007 contra menos de R$ 60 milhões pagos em ações de revitalização de bacias hidrográficas, incluindo a do rio São Francisco. A lei orçamentária autorizou gastos de R$ 697,5 milhões com revitalização e de R$ 383,9 milhões com a transposição.
Os números, pesquisados pela ONG Contas Abertas a pedido da Folha, contrariam o discurso do governo durante a greve de fome do bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, de que vem dispensando tanta atenção à recuperação do São Francisco quanto às obras que levarão parcela das águas do rio a quatro Estados nordestinos: Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.
Liberada recentemente pelo Supremo Tribunal Federal, a movimentação nos canteiros de obras nos municípios de Cabrobó e Floresta, em Pernambuco, será retomada no dia 7, depois do período de recesso das tropas do Exército, responsáveis pelos dois primeiros trechos dos 660 quilômetros de canais de concreto do projeto.
Documentos do PAC mostram que, até 2010, a cada real investido na revitalização do São Francisco, serão gastos quatro com a transposição. O custo da obra é estimado em R$ 5 bilhões. A maior fatia irá remunerar empreiteiras privadas. Somente neste ano, foram gastos R$ 12 milhões com indenizações a proprietários de terras no caminho dos 660 quilômetros de canais da transposição, nos eixos Norte e Leste.
Desse total, o maior valor -R$ 1,9 milhão- foi pago aos proprietários das Fazendas Ribeirão, donos de 540 hectares de terra no município de Brejo Santo, no Ceará. A propriedade fica no meio do caminho do eixo Norte da transposição.
Os donos da Ribeirão, junto com Antônio Simões de Almeida, estão entre os primeiros milionários da transposição. Almeida acertou em junho a indenização de R$ 1,02 milhão pela desapropriação da fazenda Tucutu, de 600 hectares, nas margens do São Francisco, no ponto de captação das águas no eixo Norte, em Cabrobó (PE).
O consórcio Logos-Concremat, contratado para gerenciar o projeto, já faturou mais de R$ 20 milhões desde 2005.
Nos últimos três anos, o Tesouro Nacional desembolsou R$ 370 milhões na obra, uma das prioridades do presidente Lula. O valor não inclui os compromissos de gastos ainda não quitados até o dia 27, e que passavam de R$ 300 milhões. FONTE: Folha de São Paulo ? SP