A questão ambiental do Brasil tornou-se pauta do dia e urgente, não da agenda governamental nacional de incentivo à proteção ao meio ambiente, mas dos meios de comunicação nacional e internacional, tendo como destaque o aumento das queimadas na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal, que ardem em chamas, devido aos inúmeros incêndios provocados pela ação humana, e em grande parte, criminosos.
Dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologias e Inovações, que tem como objetivo, dentre outros, monitorar o clima e as mudanças climáticas, comprovam um aumento significativo no número de focos de queimadas no Brasil.
Segundo o INPE, em 2018 foram 49.401; em 2019 totalizam 87.256, e em 2020, somente no período de 01/jan a 29/08/2020* os focos de queimadas no país já somam 86.909, dados que subsidiam o que ambientalistas e diversos entidades não governamentais vêm denunciando: que o atual Governo fechou os olhos à degradação ambiental, com destaque à questão das queimadas, que correm soltas, e de enfraquecimento dos órgãos de fiscalização, a exemplo do IBAMA e do ICMBio, que tornaram-se sem eficácia, inoperantes, e a cada dia mais sucateados.
* http://queimadas.dgi.inpe.br/queimadas/portal-static/situacao-atual/
Tudo isso nos leva a crer que há uma agenda oculta, em curso, implementada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), endossada pelo presidente da república, de favorecimento ao agronegócio, de madeireiros, de garimpos e mineradoras (ilegais), e de grileiros de terra pública, tudo sob a narrativa de que os biomas precisam ser explorados em nome do desenvolvimento econômico.
Foto: Chico Ribeiro
O Governo conduz a política ambiental à base do negacionismo à ciência, é como se os números não existissem, apesar de que o próprio INPE tabula dados demonstrando o significativo avanço das queimadas nos últimos dois anos, e que tal fato influencia drasticamente no regime de chuvas e nas mudanças climáticas. Ocorre que, enquanto o Governo fica nessa guerra entre negacionismo x ciência, a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal continuam sob ataque do fogo. Nesse contexto, o MMA segue fechando os olhos à expansão das fronteiras agrícolas em direção ao cerrado, a Amazônia Legal, inclusive às áreas nativas desmatadas, sendo que é fato de que as queimadas, principalmente na Amazônia, estão diretamente relacionadas ao desmatamento.
Pressionado pela repercussão internacional da degradação ambiental efetivada através das queimadas na Amazônia, e ainda pelo Agronegócio, que vem sofrendo boicote de parte de países europeus na aquisição de produtos agropecuários brasileiros, o Presidente Bolsonaro assinou o Decreto 10.424 de 15/07/2020, suspendendo por 04 meses as queimadas em todo o território nacional, inclusive as controladas, entretanto, o decreto demonstra ser uma resposta inócua às cobranças da comunidade internacional, mas, na prática, tem se mostrado ineficaz, letra-morta, visto o número de focos de calor apontados pelo INPE.
Há de se dizer que há pouca dotação orçamentária aprovada pelos Governos Federal, Estaduais ou Municipais para ações de prevenção, e de combate ao desmatamento e as queimadas. Apesar do orçamento total de R$ 1,75 bilhão do IBAMA, um montante muito menor, de apenas de R$ 76,1 milhões é destinado a ações de fiscalização contra as queimadas e o desmatamento, dinheiro já gasto do primeiro semestre de 2020, e apesar da injeção de R$ 50 milhões, recuperados da Petrobrás pela operação Lava Jato, ainda assim é insuficiente para a realização de um trabalho eficaz nessa área. Essa baixa no caixa do IBAMA é reflexo ainda da queda dos recursos de fundos específicos, a exemplo do fundo do clima e das multas, que acabaram sendo deixados de lado. Houve uma redução no número de multas aplicadas em mais de 50% entre o primeiro semestre de 2019 a 2020.
Tende a piorar!
Para 2021 a situação tende a piorar, pois já há rumores nos bastidores do poder executivo de que a ordem é cortar 20% do orçamento do MMA, o que se configura em uma estratégia governamental que deliberadamente visa enfraquecer a proteção ambiental no Brasil, conclusão a que se chega não só pela questão financeira dos órgãos de fiscalização, mas também por decisões do Ministro Ricardo Salles, como as exonerações de coordenadores de fiscalização do IBAMA após a execução de operações bem sucedidas em terras indígenas, a redução do número de horas de servidores que podem se dedicar a atividade de campo [como a fiscalização ambiental], lembrando que ao assumir o MMA, o ministro Salles removeu os superintendes do IBAMA em 21 dos 26 Estados brasileiros, sendo que os cargos ficaram desocupados durantes meses, desarticulando o trabalho do órgão.
É tudo muito perverso, danoso e triste. As questões ambientais não estão na agenda governamental com fins de fiscalizar, preservar, reflorestar, enfim, de incentivos às práticas de uso sustentável do meio ambiente. Basta ver o que acontece, nossos biomas queimam, e as consequências são devastadoras, com a perda da biodiversidade, a erosão e empobrecimento dos solos, a devastação das florestas, só para citar alguns dos problemas que precisam ser enfrentados pelo MMA, contudo, o ministro Salles não apresenta uma agenda concreta de enfretamento dos problemas ambientais.
Foto: Chico Ribeiro
Vale ainda lembrar que as queimadas também impactam fortemente na economia regional, uma vez que dificultam o escoamento da produção e causam acidentes nas estradas devido à fumaça, bem como aumentam a emissão de gases de efeito estufa. É ainda uma ameaça à saúde pública, pois a fumaça contém vários elementos tóxicos, que inalados pela população, causam alergias, chegam ao sangue, que por sua vez é responsável pelo transporte de oxigênio para as células e tecidos do corpo, atingem diretamente os pulmões, enfim, causam o adoecimento da população. Queimadas e fumaça que são ainda mais danosas nesse período de pandemia, visto que o coronavírus (Covid-19) afeta principalmente o pulmão de quem foi infectado.
Conter as queimadas é um problema que envolve diversos fatores, a exemplo da conscientização do homem, pois grande parte dos incêndios ainda é provocada voluntariamente, mas também é necessário que o Ministério do Meio Ambiente implemente políticas públicas concretas, que mantenham as áreas verdes, e intensifique as fiscalizações, pois as pessoas precisam da natureza para viver.
Quanto a nós, da CONTAG, Federações e Sindicatos filiados, e dos movimentos sociais e sindical, ambientalistas e da sociedade civil organizada, precisamos nos indignar e combater essa situação, e abrir um amplo processo de debate sobre a questão das queimadas, identificar formas de luta que contribuam para apresentarmos alternativas que confrontem a destruição da humanidade e do meio ambiente.
FONTE: Rosmarí Malheiros, secretária de Meio Ambiente da CONTAG