Flávio Novaes
Encontrar postos de trabalho na agricultura familiar e nos pólos calçadista, de confecção e artesanato são algumas das alternativas encontradas para as famílias da zona rural de Santo Antônio de Jesus, que continuam arriscando à vida com a fabricação ilegal de explosivos. Representantes de organizações não-governamentais, das secretarias de estado e da prefeitura da cidade se reuniram, ontem pela manhã, na Secretaria Estadual da Justiça e de Direitos Humanos para mais uma discussão do grupo de trabalho criado no ano passado a fim de procurar soluções para a comunidade local. Nova reunião está marcada para 11 de março, também na secretaria.
A abertura de linhas de financiamento especiais é apontada como uma das saídas para a transformação de localidades como Gamelo, situada a 7km do centro do município onde, na última terça-feira, duas pessoas ficaram feridas depois de uma explosão. A idéia é que, a partir de projetos viáveis, seja possível captar recursos para dar aos moradores a chance de desenvolver novas atividades.
"Precisamos criar opções de geração de emprego e renda, apesar da questão cultural que envolve toda a região", afirma Manuel Mota, o Manoel Missionário, integrante do Movimento onze de Dezembro e um dos participantes da reunião. "Essa já é uma tradição de mais de cem anos e envolve mais de 15 mil pessoas que trabalham sem carteira assinada", acrescentou Aílton Santos, coordenador do pólo sindical da região.
Uma das principais apostas está na vocação de Santo Antônio de Jesus para o trabalho no campo. O solo do recôncavo baiano - região aonde está situado o município - pode ser o destino do trabalhador clandestino. "As famílias de lá possuem três, quatro tarefas onde podem plantar, por exemplo, laranja, limão, lima", diz Antonio Galvão, titular da secretaria de Indústria, Comércio, Agricultura e Meio Ambiente de Santo Antonio de Jesus, apontando a citricultura como uma das saídas.
Um modelo de plano de trabalho, distribuído para os participantes da reunião, deverá ser desenvolvido no próximo encontro com informações técnicas, como propostas e a descrição das ações a serem promovidas na região. "Todas as secretarias de estado, do município e as entidades estão envolvidas neste processo para mudar a realidade do local", garante Frederico Fernandes, superintendente de apoio e defesa dos Direitos Humanos da Secretaria de Justiça e que representou o órgão na reunião. A preocupação aumenta devido à proximidade das festas juninas, quando a produção aumenta e, com ela, o perigo de novas tragédias.
Falta de assistência é criticada
Em meio às discussões técnicas, Rosângela Rocha, outra integrante do Movimento 11 de Dezembro, reclama da demora para a tomada de decisões e do que considera uma má vontade do governo. "O processo está um pouco lento, mas estou confiante", diz ela, que perdeu, em 11 de dezembro de 1997, três irmãos em Joerana, na zona rural de Santo Antônio de Jesus, onde 64 pessoas morreram após uma explosão.
"A mobilização está acontecendo porque existe uma ordem de cima, não porque eles querem", afirma ela, referindo-se à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CDIH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), que pressionaram o governo brasileiro pela demora no julgamento dos responsáveis e à falta de assistência por parte dos acusados e do estado brasileiro às famílias das vítimas.
O encontro de hoje aconteceu dois dias depois de mais um acidente na região. Na terça-feira, uma máquina utilizada para a mistura de enxofre, carvão e salitre explodiu quando dois homens a manuseavam para produzir fogos. Roberto Carlos Barbosa dos Santos, 34 anos, e Jeferson Ramos Santana, 14, continuam internados no Hospital Geral do Estado (HGE). De acordo com o médico Antonio Antico, Santana está fora de perigo, enquanto Santos ainda corre risco de morte. "Foi uma coincidência, nosso encontro já estava marcado há mais de dez dias", afirma Frederico Fernandes. FONTE: Aqui Salvador ? BA