O trabalho mostra como os Estados Unidos e a União Européia subsidiam a produção de álcool e de biodiesel, protegem o mercado interno com elevadas barreiras tarifárias e distorcem as condições de comércio. Além dessa distorção, essas políticas provocam aumentos de preços de alimentos básicos, pelo uso ineficiente de matérias-primas - basicamente o milho, no caso dos Estados Unidos.
Os autores do estudo fizeram uma simulação, por eles classificada como politicamente improvável, de como estariam os mercados em 2012 se os governos americanos e europeus decidissem eliminar os subsídios à produção e as barreiras à importação de biocombustíveis. Sobrariam no mercado como grandes produtores o Brasil e alguns países em desenvolvimento. Latino-americanos dominariam o mercado de etanol, e o de biodiesel seria liderado por asiáticos, com destaque para a Índia.
A análise do cenário vale mais como ilustração do que como previsão, advertem os autores, mas os pontos principais do argumento são claros e bem fundados. O etanol de cana produzido no Brasil é muito mais barato que o álcool de milho fabricado nos Estados Unidos, mais eficiente como combustível e mais favorável ao ambiente.
Os técnicos do FMI são mais diretos também ao propor soluções práticas para os problemas associados à produção e à comercialização de biocombustíveis. A primeira e mais importante recomendação é a mudança radical das políticas seguidas nos Estados Unidos e na Europa. É preciso eliminar os subsídios à fabricação e derrubar as barreiras à importação do etanol e do biodiesel produzidos no Brasil e noutras economias em desenvolvimento.
Uma iniciativa desse tipo seria benéfica para todos. A adição de álcool e biodiesel aos combustíveis derivados de petróleo contribuiria para reduzir a poluição. A escolha de matérias-primas mais adequadas à produção dos biocombustíveis eliminaria ou reduziria a pressão sobre as cotações de alimentos importantes, como o milho, o trigo, a soja e as carnes. Isso favoreceria os consumidores de todo o mundo, principalmente os dos países pobres, porque a alimentação pesa muito em seu orçamento familiar. Haveria maiores oportunidades de emprego e de renda nos países produtores de biocombustíveis. Enfim, esses países poderiam ainda ganhar créditos de carbono de acordo com o mecanismo definido no Protocolo de Kyoto.
Vale a pena os governos apoiarem as pesquisas para o desenvolvimento de biocombustíveis, segundo o trabalho do FMI, porque nesse caso os benefícios produzidos são públicos. Vale a pena, igualmente, tornar obrigatória a mistura, durante um período limitado, para facilitar a adoção dos novos combustíveis.
A intervenção do FMI no debate pode ser surpreendente à primeira vista, mas é oportuna e plenamente justificável. A defesa do livre-comércio tem sido uma bandeira constante da instituição desde os primeiros tempos. Afinal, o primeiro objetivo do FMI, criado no final da 2ª Guerra, foi a restauração da disciplina cambial necessária à competição justa, abandonada nos anos 30. Além disso, é sua função trabalhar pela estabilidade de preços, e a produção eficiente e competitiva de combustíveis é uma condição importante para esse objetivo. Enfim, o assunto interessa de modo especial aos países em desenvolvimento, pois a exportação de biocombustíveis pode favorecer a criação de empregos e o combate à pobreza, temas importantes, agora, na agenda política do FMI e não só do Banco Mundial. FONTE: Estado de São Paulo ? SP