CNBB desautoriza bispo de Presidente Prudente, mas religioso volta a dizer que apóia ocupações
JOSÉ MARIA TOMAZELA - Agencia Estado
SOROCABA, SP - Um dia depois de o bispo de Presidente Prudente, na região oeste de São Paulo, d. José Maria Libório Saracho, ter anunciado apoio às invasões de fazendas no Pontal do Paranapanema, integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ligados ao líder dissidente José Rainha Júnior invadiram hoje a Fazenda Esperança, em Iepê. É a 19ª área invadida durante a Operação Carnaval, segundo os líderes dos sem-terra - a 15ª pelas contas da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp). De acordo com a Polícia Militar (PM), as primeiras 20 famílias de sem-terra chegaram à fazenda às 2 horas, arrebentaram o cadeado de um portão e escolheram uma área de pastagem para instalar os barracos.
Um bambu foi usado para içar a bandeira do MST. Outro grupo chegou quando o sol raiava. O líder Antônio Carlos dos Santos disse que a propriedade foi considerada improdutiva pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). "Queremos que seja desapropriada." O proprietário, José Carlos Garla, afirmou que as terras são produtivas.
Garla pedirá a reintegração de posse na Justiça. A invasão aconteceu algumas horas antes de d. José receber os líderes dos invasores na Cúria Diocesana de Presidente Prudente. Ele é o representante da Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Igreja Católica no Estado e a audiência tinha sido pedida por Rainha Júnior, que pretendia que d. José intercedesse com o governador José Serra (PSDB) para a retirada do projeto de regularização das terras do Pontal.
A proposta, que abrange fazendas com mais de 500 hectares (5 milhões de metros quadrados), aguarda votação na Assembléia Legislativa. Além do líder dissidente do MST, compareceram representantes do Movimento dos Agricultores Sem-Terra (Mast), Unidos pela Terra e Fome Zero (Uniterra) e Terra Brasil, e sindicalistas que apóiam os sem-terra.
Desautorizado
Apesar de ter sido desautorizado pelo secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), d. Airton José dos Santos, de falar em nome da Igreja, o bispo de Presidente Prudente voltou a dizer que apóia as ocupações, pois considera um "instrumento de luta" dos sem-terra. D. José Maria disse que ocupar o latifúndio é uma questão de sobrevivência e afirmou que há crianças passando fome nos acampamentos. O bispo de Prudente voltou a criticar o projeto de Serra, cuja aprovação, segundo ele, seria a legalização da grilagem.
Se a proposição for aprovada, d. José Maria disse que o governador de São Paulo teria de dar cartões corporativos como os que os assessores dele usam para os sem-terra comprarem arroz e feijão. O bispo assumiu o compromisso de intermediar um encontro entre Serra e os líderes dos sem-terra, mas afirmou que "o diálogo era mais fácil" quando o governador era Geraldo Alckmin (PSDB).
Os sem-terra entregaram a d. José Maria um cadeado e uma corrente. "A corrente é agronegócio que escraviza o trabalhador e o cadeado é para abrir as porteiras do latifúndio", afirmou Rainha Júnior. O bispo disse que, por ser representante da CPT em São Paulo, pode emitir juízo sobre a realidade dos sem-terra, que fazem parte da diocese. "A reforma agrária (no Pontal) parou no tempo, não há avanços, nem expectativa, e o projeto (de Serra) é uma ameaça real."
De acordo com o diretor do Itesp, Gustavo Ungaro, o projeto do governador abre a oportunidade para resolver as questões fundiárias históricas do Pontal. A regularização está condicionada à cessão de parte das terras para a reforma agrária, o que, segundo ele, resolveria a dificuldade da arrecadação de áreas para assentamentos. "Não é nada compulsório; o projeto abre a faculdade de se fazer acordos na Justiça." Independente disso, o Itesp faz a arrecadação das fazendas cujos proprietários se dispõem a negociar o pagamento das benfeitorias. "Obtivemos duas fazendas no fim do ano passado, sendo que uma delas já nos foi repassada."
Prazo
O proprietário da outra ainda tem prazo para fazer a entrega. D. José Maria criticou a demora dos assentamentos em áreas arrecadadas pelo Itesp, mas, segundo Ungaro, o uso das fazendas ainda depende de licenciamento ambiental. "A exigência da licença para novos assentamentos foi criada pelo Consema (Conselho Nacional do Meio Ambiente), que é um órgão federal." Ele disse que o Itesp está cumprindo o que a lei determina. O órgão estadual usou mais de 90% das verbas efetivamente repassadas pelo Incra, segundo Ungaro. "Uma coisa é o valor previsto no contrato, outra é recurso efetivamente repassado." O convênio com o Incra continua em vigor, segundo ele. FONTE: Estadão Online ? SP