Famílias de sem-teto, liderados pelo Movimento Terra para Todos (MTT), continuam ocupando o terreno às margens do Anel Viário de Fortaleza, de propriedade da Companhia de Desenvolvimento do Ceará (Codece). O órgão do Estado aguarda decisão do juiz da 3ª Vara da Comarca de Maracanaú, Cézar Belmino Barbosa Evangelista Júnior, sobre o pedido de reintegração de posse da área invadida em julho de 2007, compreendendo parte do Sítio Macacos de 77,5 hectares, em Pacatuba, e da gleba A" de 156,7 hectares, em Maracanaú.
Enquanto o impasse entre posseiros e a Codece persiste, os empresários da área estão revoltados com a invasão que prejudica a instalação de novas indústrias e a expansão do atual parque do Distrito Industrial III de Maracanaú. Temendo retaliações, os industriais preferem não se identificar. É o caso da proprietária de uma empresa de logística que espera o sinal verde da Codece para transferir as unidades da empresa, localizadas no Mucuripe e na BR-116, para uma área maior no Anel Viário.
O presidente da Codece, João Francisco Teixeira, disse que tomou conhecimento da invasão no fim de julho de 2007. "No início de agosto, uma equipe da Companhia esteve no local e constatou que as pessoas estavam se organizando para construir as casas", diz.
Ainda em agosto do ano passado, diz, a Codece realizou três reuniões com os ocupantes. Duas delas foram intermediadas pela Secretaria de Desenvolvimento Agrário e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), sem sucesso. A terceira foi uma audiência pública na Assembléia Legislativa. "Nesses três encontros, salientamos a impossibilidade de a Codece ceder o terreno aos invasores, por trata-se de uma área destinada para fins industriais", explica.
Como não houve acordo entre as partes, o presidente da Codece chamou Polícia para expulsar do terreno os invasores. "Eles saíram da área duas vezes, mas voltaram pela terceira vez", afirmou Teixeira. Em 5 de setembro do ano passado, o órgão entrou, no Fórum de Pacatuba, com ação de reintegração de posse do imóvel Sítio Macacos.
O processo foi distribuído à 1ª Vara sendo julgado pelo juiz substituto Everardo Birman, que negou o pedido do governo do Estado. Em 15 de outubro, a Codece entra com pedido de reconsideração de despacho, com interposição de Agravo de Instrumento para o titular da Vara, juiz Cláudio Ibiapina. "O juiz ratificou a decisão do juiz substituto. Com essa decisão, os posseiros sentiram-se fortalecidos, admite João Teixeira.
Após a segunda derrota na Comarca de Pacatuba, a Codece protocola nova Ação de Reintegração de Posse em 3 de dezembro do ano passado, desta vez no Fórum de Maracanaú. "Aguardamos a decisão do juiz da Cézar Belmino sobre o caso", diz o presidente da Companhia de Desenvolvimento.
O juiz Cézar Belmino também vai julgar a Ação de Reintegração de posse do imóvel da gleba A" no Distrito Industrial III, que margeia o Anel Rodoviário e liminar de perdas e danos. O processo chegou a 3ª Vara do Fórum de Maracanaú no dia 3 de dezembro último.
Neste segundo processo, a Codece, além de apresentar os mapas das áreas invadidas e documento de posse do terreno, lista as empresas com reserva de área no Distrito Industrial III. O processo está concluso desde o último dia 22, aguardando julgamento dos pedidos de litispendência e exceção de incompetência. "Com a demora da Justiça, a área invadida virou um loteamento demarcado, com arruamento", finalizou João Teixeira.
DESENVOLVIMENTO
Distritos com capacidade máxima
O terreno do Estado que estava reservado para instalação da Zona de Processamento de Exportação (ZPE), hoje invadido por sem-teto, pode acabar com o sonho do Município de Maracanaú de expandir o Distrito Industrial III naquele local.
Para o secretário de Desenvolvimento Econômico de Maracanaú, Antônio Rodrigues Filho, a área representa a última alternativa do Município para abrigar novas empresas, uma vez que os três distritos industriais de Maracanaú estão com 85% a 90% da sua capacidade instalada ocupada.
No caso do Distrito Industrial I, 85% da área de 1.000 hectares já foi ocupada por indústrias, os 15% restantes estão em processo de instalação. O Distrito Industrial 2000 já tem 90% dos 35 hectares com empresas instaladas e os 10% restantes já estão comprometidos, com protocolo de intenções. O DI III, localizado no Anel Viário, foi ocupado 90%.
Sem espaços disponíveis nos distritos industriais, "o prefeito Roberto Pessoa encaminhou em 31 de março de 2005, ofício ao governador Lúcio Alcântara solicitando a destinação da área da ZPE para implantação de novas empresas em Maracanaú", explica o secretário.
O secretário de Desenvolvimento Econômico fez histórico da invasão desde 3 de agosto de 2007, quando a Prefeitura de Maracanaú tomou conhecimento do problema. Em 8 de novembro de 2007, a SDE de Maracanaú envia fax ao Superintendente da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) denunciando o desmatamento da área. "Até hoje não recebemos resposta", diz o secretário Antônio Filho.
Ainda segundo ele, no dia 8 de janeiro deste ano, foi comunicado à Companhia Energética do Ceará (Coelce) que havia ligação clandestina na área. "Os técnicos foram impedidos de retirar a gambiarra devido ameaças dos invasores em colocar fogo na viatura da empresa, conforme Boletim de Ocorrência nº 129-53/2008", relatou o secretário que torce para ver o problema resolvido.
LOTEAMENTO
Mais de 1.400 famílias residem no terreno
Os sem-teto, que estão no terreno do Estado entre Pacatuba e Maracanaú, em sete meses de ocupação já demarcaram os lotes, abriram ruas e construíram 378 casas que ocupam três áreas distintas entre Pacatuba e Maracanau. São as comunidades de Nova Pacatuba, Nova Conquista e Nova Jerusalém.
Há denúncias de venda irregular de lotes, por R$ 2.700,00 o terreno na frente, e por R$ 1.600,00, os localizados nos fundos da área. Besaliel Ribeiro, um dos três líderes comunitários, nega o fato.
Ele argumenta que a comunidade é grande e que "pode estar havendo venda de lote sem o nosso conhecimento". Segundo Ribeiro, a área foi ocupada para se transformar em um assentamento rural, mas com a chegada de muitas pessoas tornou-se urbano. "Vivem aqui famílias de agricultores, autônomos, mecânicos, bombeiros, entre outros profissionais", diz o líder.
Os primeiros tiveram a liberdade para escolher o lote. É o caso do agricultor Manoel Alves de Queiroz, 48 anos. Ele construiu uma casa de dois cômodos onde mora com a família. Ele cultiva feijão, milho, fava, melão e melancia. "Espero colher de 30 a 50 sacos de grãos, se não faltar chuva", afirma o agricultor. A costureira Carmen Silva, 30 anos, chegou há uma semana. Ela está concluindo a sua casa.
O QUE ELES PENSAM
Poder público critica a ação dos invasores
"O prejuízo para o Município é imenso com a invasão. Se tivessem ocupado cinco hectares o impacto não era tão grande, mas eles ocuparam todo o terreno, uma maldade. No local, o Município poderia colocar cerca de 70 novas indústrias, de porte médio e pequeno, com a expectativa de gerar 40 mil empregos na região."
Roberto Pessoa
Prefeito de Maracanaú
"O Governo do Estado está aguardando o resultado na Justiça. Os posseiros invadiram uma área nobre destinada à instalação de indústrias, mas enquanto o problema não for resolvido fica difícil trazer novas empresas. A invasão prejudica os investidores e empresários que desejam se expandir."
Ivan Bezerra
Pres. Conselho de Desenvolvimento Econômico do Governo do Estado
"As áreas vocacionais para indústrias devem ser mantidas, mas muitos terrenos, como este, são invadidos. O setor industrial tem feito um trabalho para evitar isso, mas a situação está ficando cada vez pior. Sentimos que está havendo um descontrole do Governo do Estado e das autoridades públicas para manter a ordem."
Roberto Macêdo
Pres. da Federação das Indústrias FONTE: Diário do Nordeste ? CE