A transposição do Rio São Francisco tem apoio da maioria dos governadores de Estados nordestinos envolvidos no projeto - Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. As únicas vozes dissonantes vêm do sergipano Marcelo Déda - do mesmo partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT -, e de seu colega alagoano, Teotônio Vilela, do oposicionista PSDB.
Ironicamente, os dois Estados não são considerados nem doadores de água, como Bahia e Pernambuco, de onde vai ser retirada parte da água do rio, nem receptores (Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e um trecho do sertão pernambucano). Entre os técnicos, eles são chamados de doadores indiretos, porque as águas desviadas do rio na Bahia e em Pernambuco chegariam a Sergipe e Alagoas.
"Tenho uma posição crítica à transposição porque, na minha opinião, o projeto ?secundariza? os interesses dos Estados da Bacia do São Francisco, trata com timidez a questão da revitalização do rio e não resolve dúvidas relacionadas aos impactos ambientais", explica Déda. "Do mesmo modo, não me convenço de que o projeto, na forma em que se encontra, seja a solução técnica com o melhor custo-benefício para a falta de água no Nordeste Setentrional." Na sua opinião, não houve um "debate consistente" para a elaboração de políticas de recursos hídricos para o semi-árido nordestino. O governador acha que isso seria fundamental para que o projeto pudesse ser posto em prática.
"Não duvido das boas intenções do presidente e da sua equipe, por isso sempre quis que todos os governadores da região fossem envolvidos nos debates, ao lado dos movimentos sociais e de pesquisadores que estudam o assunto", argumenta Déda. "Por outro lado, a radicalização com a qual a transposição foi tratada, tanto pelos defensores quanto pelos que a combatem, terminou prejudicando um debate mais aberto e franco. Ainda há tempo para o diálogo e - quem sabe? - o consenso."
"Mesquinharia"
Do outro lado da mesa, o mais eloqüente defensor do projeto é o governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), irmão do deputado Ciro Gomes (PSB-CE), um dos mentores do atual projeto de transposição, elaborado enquanto ele era ministro da Integração Nacional. "Praticamente não há cearenses contrários ao projeto", acredita Cid Gomes. "A transposição é de fundamental importância para o Nordeste como um todo."
Ele discorda dos grupos que acham que a revitali- zação deve ser feita antes da transposição. Para Cid, esse debate não passa de "mesquinharia" dos Estados que vão ser afetados pela retirada das águas. "Sabemos que o processo de assoreamento do rio é gravíssimo, mas ele vem acontecendo há séculos", diz. "A revitalização já está prevista no projeto, mas não há tempo de executá-la antes da transposição porque o que está em jogo é o abastecimento humano, que está próximo do colapso."
Déda responde que não é movido por "nenhum egoísmo hídrico ou fundamentalismo ambien- tal". E insiste: "O que não se pode é mexer num tema tão candente sem buscar um mínimo de consenso. Na luta contra a seca, todos precisamos da vitória. E será uma tragédia se, ao final, realizando-se ou não a obra, o Nordeste se dividir em ganhadores e perdedores."
Na Paraíba, o governador Cássio Cunha Lima (PSDB), buscou mobilizar a sociedade para apoiar a transposição. Em julho ele lançou o Comitê Paraibano em Defesa da Transposição do Rio São Francisco, que é presidido pelo arcebispo do Estado, D. Aldo Pagotto, e reúne representantes de vários setores sob o lema "Quem tem sede apóia". "É preciso deixar de lado as questões partidárias para que a obra seja feita, levando água de beber para os nordestinos", afirma Cunha Lima.
Para o governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), é natural que não haja consenso. "É claro que uma obra dessa magnitude causa controvérsias. Respeito quem é contra, quem fala que é preciso mais debate, mas é preciso entender que chega uma hora em que o Executivo tem de tomar uma decisão. E foi decidido que esta é uma obra que vai ajudar o povo nordestino a ter acesso à água, a ter mais dignidade, por isso a apóio."
Segundo ele, obras de transposição são mais comuns do que se pensa. "Muitas metrópoles são abasteci- das por águas de rios transpostos. Cerca de 60% da água consumida em Salvador, por exemplo, vem do Rio Paraguaçu, que nasce na Chapada Diamanti- na e deságua na Baía de Todos os Santos."
(Correio de Sergipe) FONTE: Gazetaweb ? AL