"Há uma situação muito clara no arco do desmatamento, onde há ausência do poder público e trabalho escravo", afirma o autor do estudo
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
As cidades que mais desmatam no Brasil figuram também na lista das mais violentas do país, conforme aponta o mapa da violência dos municípios brasileiros, divulgado ontem.
De uma lista de 36 cidades responsáveis por metade da derrubada recente de árvores da Amazônia Legal, divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente, 23 delas estão entre as 10% mais violentas do país.
O trabalho utilizou informações das certidões de óbito registradas no Subsistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde. São considerados homicídios desde mortes por objetos cortantes (16,1%) até vítimas de armas de fogo (74,4%). Os dados mais recentes são de 2006.
Com essas informações, foi feita uma lista com as 556 cidades mais violentas, que correspondem a 10% dos 5.564 municípios brasileiros e abrangem 44,1% da população do país e 73,3% dos homicídios ocorridos em 2006. Essas 556 cidades têm média de 144 mil habitantes -contra 32,6 mil em todos os municípios do país. De acordo com o autor do estudo, o pesquisador Julio Jacobo Waiselfisz, houve no país uma "interiorização" da violência nos últimos anos.
Waiselfisz defende o uso do índice de homicídios para medir a violência em geral nos municípios porque, em primeiro lugar, "a intensidade dos diversos tipos de violência guarda uma estreita relação com o número de mortes que origina."
Dessa forma, os dados de homicídios colocam na lista das 10% mais violentas 25 capitais do país -só ficaram de fora Boa Vista (RR) e Natal (RN)-, municípios em região de fronteira, com conflitos de terra, turísticos e em desenvolvimento.
É o caso da cidade com maior taxa de homicídios do país. Com 13.979 mil habitantes de acordo com a última contagem populacional do IBGE, Coronel Sapucaia, no Mato Grosso do Sul, fica próxima da fronteira com o Paraguai. Sua taxa de homicídio é de 107,2 em 100 mil habitantes. Se fosse considerado o número absoluto de homicídios, independentemente do número de habitantes, a liderança ficava com São Paulo -2.546 casos em 2006.
Em segundo, Colniza (MT), que liderava a lista anterior, é também um dos municípios que mais desmatam. Embora considere o número muito alto, Waiselfisz comemorou o fato de o índice da cidade mato-grossense ser menor do que o anterior, que era de 165,3.
Para ele, a concentração de mortes nessas áreas se explica pela pouca presença do Estado. "Há uma situação muito clara no arco do desmatamento, onde há ausência do poder público, propriedades ilegais e trabalho escravo", diz ele.
Outras, como Caraguatatuba -a mais violenta do Estado de São Paulo-, têm parte da violência explicada pelo fluxo de migrantes, atraídos pelo turismo ou pelo desenvolvimento econômico. "De forma geral, os municípios que tiveram um processo intenso de desenvolvimento e migração viram crescer os indicadores de violência", diz Jorge Werthein, da Ritla (Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana).
No caso de Foz do Iguaçu (quinta mais violenta do país), no entanto, a localização fronteiriça é considerada uma explicação mais provável. "Por muito tempo se tratou a violência na cidade como um problema social", diz Luiz Paulo Barreto, secretário-executivo do Ministério da Justiça. Para ele, houve "permissividade" no trato de delitos como o contrabando, que acabaram evoluindo com o narcotráfico.
Barreto diz que o ministério investe em postos policiais nas fronteiras e que o "PAC da Segurança" irá atuar na prevenção da violência. (ANGELA PINHO) FONTE: Folha de São Paulo ? SP