27/12/2007
Depois de registrar um aumento expressivo de área e produção nos últimos anos, a expansão da cultura do algodão no Brasil deverá desacelerar. O crescimento da área para plantio de grãos - soja e milho - e de cana deve limitar o avanço da pluma, que teve forte retomada no país a partir dos anos 2000.
Sinais de que o freio de mão já foi puxado são observados nesta safra 2007/08. O plantio no país deve subir 5% e a produção 5,5%, segundo estimativas preliminares da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa). O crescimento é tímido, considerando que a produção da pluma chegou a avançar, em média 50%, nas safras 2003/04 e 2006/07.
O algodão voltou a se consolidar no país a partir de 2000, alcançando a excelência de qualidade e tornando-se referência no mercado internacional, duas décadas depois de ter sido relegado a segundo plano. Naquela época, a fibra brasileira era considerada de qualidade duvidosa pelo mercado.
Diante das perspectivas atuais - preços atraentes para o milho e soja - e avanço da cana pelos quatro cantos do país, apenas o 'efeito China' desvia o algodão de seu atual crescimento letárgico, acredita boa parte dos analistas ouvidos pelo Valor. Nesse caso, qualquer sinal de maior demanda por parte dos chineses, o cenário para o algodão não mudaria apenas no Brasil, mas em todo mundo.
Nenhum analista decreta o fim do algodão no Brasil. Muito pelo contrário. Os avanços obtidos nas lavouras nos últimos anos alçaram o país ao posto de quarto maior exportador mundial. No entanto, a fotografia atual e a projetada para os próximos dois anos colocam a soja, o milho e a cana como as principais culturas com condições de aumento expressivos de área no Brasil por conta do boom da demanda por biocombustíveis e alimentos no mundo.
Nesta safra, depois de muitas incertezas, os produtores de algodão devem ocupar uma área de 1,151 milhão de hectares, um crescimento de 5% sobre o ciclo anterior. A produção da pluma está estimada em 1,608 milhão de toneladas, com alta de 5,5% sobre a safra 2006/07. As exportações estão estimadas em 600 mil toneladas, avançando cerca de 50% sobre a safra anterior. Os produtores estão comprometidos com contratos de exportação até pelo menos 2010. E é esse o motivo que leva o produtor de algodão a seguir firme na pluma, apesar da melhor rentabilidade atual de outras culturas.
Segundo Aires Rocha Pereira, diretor-executivo da Abrapa, o dólar enfraquecido sobre o real é um dos principais fatores de desânimo do setor. Mesmo com a moeda americana fraca, os produtores mantêm os embarques para não perder mercado.
Cultura cara, com o custo três vezes maior que o da soja, por exemplo, o algodão não costuma atrair novatos mesmo quando há um salto dos preços internacionais. "O algodão é uma cultura complexa. Expandir área exige investimento pesado. Além disso, os riscos climáticos podem prejudicar toda uma lavoura", diz José Vicente Ferraz, diretor da AgraFNP, justificando a menor mobilidade da cultura em relação a outras commodities. A China é o fiel da balança neste mercado. "Se houver uma demanda muito aquecida por parte da China pela pluma, as coisas mudam", acrescenta.
Para Marco Antonio Aloísio, da trading Esteve, o estímulo para se investir em algodão não depende somente da China. "Se os preços do algodão dispararem, os produtores podem investir na cultura [pluma]", afirma. Segundo Aloísio, não dá para afirmar categoricamente que a tendência atual para o algodão é a estabilidade de área e plantio no país. "Hoje, a situação do dólar não está favorável."
Os números mostram que o algodão teve seu auge no Brasil nas décadas de 70 e 80, mas a cultura foi declinando nos anos seguintes. Há quase três décadas, o país produzia cerca de 900 mil toneladas de algodão, mas a qualidade era considerada ruim. A retomada da produção ocorreu a partir dos anos 2000. Na safra 1999/00, o país saltou de uma produção de 700 mil toneladas para 1,6 milhão de toneladas projetada para este novo ciclo. No mesmo período, a área saltou de 823 mil hectares para 1,151 milhão de hectares, com um crescimento de 65% na produtividade por hectare.
De líquido importador, o Brasil tornou-se importante player no mercado internacional, com seu produto reconhecido pela qualidade. Na safra 2007/08, as indústrias devem importar 70 mil toneladas, recuo de 33% sobre a safra anterior. As importações estão concentradas no Nordeste, que possui incentivos fiscais nessas aquisições. Tim Kuba, diretor-executivo da Santista Têxtil, uma das maiores do país, lembra que o cenário era muito diferente há quase uma década, quando as companhias importavam mais de 40% de suas necessidades.
Apesar de ter benefícios fiscais para importar, a região Nordeste se abastece da produção do oeste baiano, único Estado que tem aumentado expressivamente a área para algodão no país. A Bahia é o segundo maior produtor de algodão, atrás do Mato Grosso. FONTE: Valor Econômico ? SP