Jacques Diouf, diretor-geral da FAO, o braço das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, cobrou ontem dos líderes mundiais US$ 30 bilhões por ano para recuperar o setor agrícola e "evitar futuras ameaças de conflitos causados pela comida".
No discurso com que inaugurou a Cúpula sobre Segurança Alimentar, que vem sendo chamada de "cúpula da fome", Diouf lembrou que, em 2006, o mundo gastou US$ 1,2 trilhão em armamentos, "enquanto o desperdício de comida em um só país poderia custar US$ 100 bilhões, e o excesso de consumo pelos obesos chegaria a US$ 20 bilhões".
Emendou: "Contra esse pano de fundo, como podemos explicar às pessoas de bom senso e boa-fé que não é possível dispor de US$ 30 bilhões ao ano para permitir que 862 milhões de pessoas famintas possam gozar do mais fundamental dos direitos humanos, o direito à comida e, assim, o direito à vida?".
É razoável supor que os líderes mundiais, especialmente dos países ricos, atendam ao apelo da FAO, ao menos parcialmente. Mesmo que o façam, só se poderá beneficiar uma fatia dos afetados pela "agflação", a disparada de preços dos alimentos.
É verdade que serão atendidos os mais pobres e, portanto, os mais necessitados. Mas os não tão pobres, também castigados pela "agflação", não têm padrinhos para defendê-los, até porque os governantes se recusam a mexer com o jogo do mercado, que determina a alta de preços. Recusam-se, em especial, a tratar da especulação com alimentos por fundos financeiros.
Só algumas ONGs, como a ActionAid, disparam o alarme: "Fluxos de investimento especulativo sem precedentes nos mercados futuros de commodities, que, de acordo com especialistas, alcançaram nada menos que US$ 1 bilhão por dia em fevereiro e março, tornaram os preços mais voláteis e os divorciaram do que é de fato produzido na terra", disse Magdalena Kropiwnicka.
FONTE: Folha de São Paulo - 04/06/2008