A demissão da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi considerada "muito grave" por entidades ambientalistas internacionais e nacionais. Para essas organizações, Marina era uma espécie de "fiadora" da política do governo do presidente Lula quanto ao meio ambiente.
"Do ponto de vista internacional, a demissão de Marina do ministério é muito preocupante e prejudica a credibilidade do governo Lula na questão da defesa do meio ambiente", avaliou ontem Scott Paul, diretor do programa de Florestas do Greenpeace. "A demissão simboliza que o governo Lula não vai mais dar prioridade para a agenda ambiental no País."
O vice-presidente para a América do Sul da entidade Conservation International, José Maria Cardoso da Silva, concorda e classificou como uma desastre a saída de Marina. "É um desastre para o governo Lula. Do ponto de vista internacional, o lastro era a Marina, não a a ministra Dilma (Rousseff) nem nenhum dos ministros que ele tem aí. Ela era tida como o seguro brasileiro do ponto de vista ambiental", afirmou.
De acordo com ele, a saída é ruim até mesmo para o agronegócio brasileiro. "Sem ela, a credibilidade do governo Lula cai significativamente. O pior de tudo é que isso acontece justamente no momento em que vários setores da economia criticam um dos grande programas do Brasil que é o do etanol", argumentou. "Muitas das críticas são do ponto de vista ambiental. E o governo ainda não provou suas garantias ambientais para expansão do etanol."
O diretor da ONG SOS Mata Atlântica, Mário Mantovani, concorda. "A notícia caiu como uma bomba", contou. "Ter uma pessoa como a Marina era ter um fiador do processo. Ela suportou a briga dos transgênicos, a briga com o Reinhold Stephanes, a questão dos licenciamentos ambientais. O estofo moral dela em um governo tão combalido eticamente como esse era o que dava suporte para nos assegurar", afirmou.
Segundo Mantovani, a preocupação imediata agora entre os ambientalistas é sobre que rumos o governo tomará. "Estamos preocupados que isso vire para o lado do ?liberou geral?, porque é isso, no fundo, o que se pensa no governo. A Marina era um empecilho para esse tipo de coisa", explicou.
"O rei ficou nu agora", disse o diretor da ONG Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, Roberto Smeraldi. "Ficou explícita e transparente a intenção do governo Lula. Essa coisa de ter o discurso da Marina pregando uma coisa e a prática do governo na direção contrária acabou."
PAC
Os especialistas apontam o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) como um dos motivos que culminaram com o processo de saída de Marina do cargo de ministra. "Foi um processo de desgaste, principalmente agora, com o predomínio de um ministério centralizado no desenvolvimento a qualquer custo. Certamente devem ter ocorrido muitos atritos entre a ministra da Casa Civil e a ministra Marina", avaliou o vice-presidente da Conservation International.
"O PAC é o que se tem de mais predador", reclamou Mantovani. "Nem os projetos mirabolantes do ?Brasil, esse é um país que vai para a frente?, nos anos 70, tinha a capacidade de ser tão ruim quanto este. Porque os militares podiam ser tudo, menos trouxas, eles tinham planejamento", disse.
Para os especialistas, o governo Lula terá agora de se esforçar mais. "O governo vai ter de mostrar um serviço muito bom daqui para a frente. Ele vai ter de tomar medidas ousadas para mostrar que a parte ambiental do Brasil vai ser tratada com qualidade", afirmou Silva.
REPERCUSSÃO
Herald Tribune
Em seu site na internet, o jornal diz que a saída da ministra Marina Silva põe fim a um mandato de seis anos que foi freqüentemente marcado por períodos tenebrosos. O texto destaca que Marina protagonizou conflitos com desenvolvimentistas na Amazônia e cita ambientalistas ligados ao Greenpeace para tentar explicar os motivos do pedido de demissão. Diz que a decisão resultou de pressões surgidas por medidas tomadas pela pasta comandada por ela no combate ao desmatamento da floresta, que teria se tornado "insuportável", de acordo com o diretor do Greenpeace no Brasil, Sérgio Leitão. Outra explicação para a saída do cargo apontada na reportagem é a decisão do governo brasileiro de dar prioridade a um "plano de desenvolvimento multibilionário" no qual outro ministro foi designado para cuidar de um projeto de desenvolvimento sustentável para a Amazônia. A ministra é citada pelos ambientalistas como uma grande perda para o País.
BBC
O portal da rádio britânica destacou o fato de Marina ter deixado o cargo sem um motivo claro para o pedido de demissão. Ao apontar que a ministra adotou uma postura crítica em relação a projetos de desenvolvimento do governo, o texto afirma que sua saída tende a aumentar a "percepção de que o presidente Lula está mais preocupado com o desenvolvimento econômico do que com a conservação". De acordo a emissora britânica, a ministra tem culpado o avanço da atividade pecuarista pelo crescente desmatamento da Amazônia. Ao mesmo tempo, ela se opôs "sem sucesso" a diversos projetos de infra-estrutura do governo federal na região da Amazônia, inclusive a construção de duas grandes hidrelétricas no Rio Madeira e uma nova rodovia de grande porte. A emissora acrescenta que a decisão do governo de autorizar o uso de transgênicos e a construção de uma usina nuclear também contrariaram as "preocupações ambientais" de Marina. FONTE: O Estado de São Paulo - 14/05/2008