O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, composto por 45 organizações, entre elas, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), acompanha desde domingo (5/6) com preocupação o desaparecimento do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista do The Guardian Dom Phillips. Eles viajavam pelo Vale do Javari, na Amazônia, quando faziam o trajeto entre a comunidade Ribeirinha São Rafael até a cidade de Atalaia do Norte.
Uma força-tarefa composta pelo Exército, Marinha, Fundação Nacional do Índio (Funai), Força Nacional, Polícia Federal e forças de segurança locais, foi designada para realizar as buscas na segunda-feira (6/6), mas até o momento não foi encontrado o paradeiro do jornalista e do antropólogo brasileiro.
É importante destacar que o indigenista Bruno Araújo Pereira, é um conhecido defensor dos direitos dos povos da Amazônia, em especial das tribos isoladas que não têm contato com a civilização industrial, e trabalhou anos na Funai até ser demitido pelo governo de Jair Bolsonaro, primeiro presidente democraticamente eleito declaradamente contrário à demarcação das terras indígenas e quilombolas. Pereira também é um dos fundadores do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Contato Recente (OPI).
Já o jornalista inglês Dom Phillips, que se mudou para o Brasil em 2007, como correspondente internacional vem atuando no Brasil cobrindo pautas na área de direitos humanos para diversos jornais estrangeiros como o Washington Post, New York Times, The Intercept, Financial Times, Tim e Bloomberg, além do próprio Guardian. Inclusive, ele conhecia bem a região sendo autor de diversas reportagens que denunciavam a situação dos indígenas na Amazônia.
Para o Comitê, o Estado Brasileiro tem o dever de proteger defensoras e defensores de direitos humanos e comunicadores como Pereira e Phillips: exigimos que as autoridades municipais, estaduais e federais se unam para solucionar esse desaparecimento que já completa cinco dias sem respostas do Estado.
Caso o governo federal não aja com a celeridade devida, acreditamos que o estado brasileiro pode ser marcado internacionalmente como um dos lugares mais violentos do mundo. É essencial que aja cooperação internacional do Brasil com as autoridades do Peru e Colômbia para encontrar Bruno Pereira e Dom Phllips.
A CBDDH ainda, manifesta apoio e se solidariza com os familiares e amigos de Bruno e Dom e seguimos acompanhando as investigações, bem como denunciando o cenário de risco que defensoras e defensores de direitos humanos enfrentam no contexto social político no Brasil.
Contexto
No Dossiê Vidas em Luta: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos, o CBDDH denuncia a situação hoje vivenciada pelas comunidades indígenas no Brasil. Os conflitos com territórios indígenas tiveram um ápice de crescimento após o golpe da presidenta Dilma Roussef, avançando a partir de mecanismo políticos realizados pelo governo de Michel Temer. Mas, a situação de violações, assassinatos e violações de direitos humanos aumentaram especialmente a partir do processo eleitoral que culminou na eleição de Jair Bolsonaro.
“Em 2020, o governo Bolsonaro continuou a fazer jus à sua cruzada contra os povos indígenas. O PL 191/2020, de autoria do governo federal, objetiva regulamentar a prática criminosa de mineração e garimpo em terras indígenas. Essa é hoje uma das principais razões de invasões em Território de Interesse Social, as quais, além de pilhar parte dos territórios indígenas, saqueiam os bens naturais das quais dispõem”, informa o documento.
De acordo com o Atlas da Violência (2021), a omissão do governo federal na fiscalização e proteção de terras indígenas, junto com a exploração ilegal de madeira, o garimpo ilegal e invasões por madeireiros e fazendeiros, vem contribuindo para o aumento da violência letal.
Conforme mapeado pelo documento, mais de 2 mil indígenas foram assassinados entre 2009 e 2019 no país. Nessa década, a taxa de mortes violentas de indígenas aumentou 21,6%, saindo de 15 por 100 mil indígenas, em 2009, para 18,3, em 2019, movimento oposto ao que ocorreu com a taxa de assassinatos em geral no país, que foi de 27,2 para 21,7 por 100 mil habitantes.
A Comissão Pastoral pela Terra, integrante do Comitê brasileiro, em outro estudo publicado em abril deste ano, mostrou que em 2021, somente nos estados da Amazônia Legal, foram 28 assassinatos.
Já o estudo Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil, divulgado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em 2020, mostra que as invasões a terras indígenas aumentaram 137% em dois anos de governo Bolsonaro. Em 2018, foram 111 casos e, em 2020, o número mais que dobrou, com 263 casos.