Durante seis anos, Sirley de Oliveira, 26, trabalhou em carvoarias de Tailândia (a 218 km de Belém) sem carteira assinada e sem direitos trabalhistas. Sua função era encher os fornos com toras de madeira, em quantidade suficiente para produzir 300 sacos de carvão por dia. Pelo serviço, ele recebia um salário mínimo por mês.
No último dia 18, ele nem chegou a lotar um forno. Foi demitido pelo dono da carvoaria que, além de explorar a mão-de-obra, também empregava matéria-prima de origem ilegal e preferiu abandonar o negócio.
O carvoeiro foi embora sem receber dinheiro -não conseguiu receber nem mesmo o salário atrasado do mês de janeiro. Casado, com dois filhos, de 5 e 7 anos, ele pensa agora em se mudar com a família para Tocantins, onde mora sua mãe, a empregada doméstica Maria Santa Rosa de Oliveira.
O problema é que Oliveira não tem dinheiro para fazer a viagem. Aliás, praticamente não tem o que comer. Na sua casa, um cômodo de madeira de apenas 16 metros quadrados, não há fogão nem geladeira. A comida é cozida em carvão. Na quinta-feira, no armário havia apenas arroz.
Na quarta, ele e a mulher, Rozinete Plácida da Silva, 26, não comeram para que as crianças se alimentassem com um pedaço de frango misturado ao arroz, comprado com dinheiro emprestado. "Os filhos, a gente nunca quer ver passar fome."
Para Oliveira, a situação atual é ainda pior do que quando era explorado nas carvoarias. "Pelo menos antes eu tinha sempre um dinheirinho para manter a família. Agora, me sinto um cara triste, chocado."
Carnês
Do tempo do trabalho quase escravo, o carvoeiro guarda nas gavetas os carnês com prestações atrasadas de um aparelho de DVD e de um colchão, comprados quando achou que sua vida iria mudar para melhor.
No corpo, as marcas do serviço pesado tiraram do carvoeiro -um sósia do jogador de futebol Ronaldinho, atacante do Barcelona- até o prazer de jogar futebol. O esforço provocou o surgimento de uma hérnia.
Hoje, a única renda da família são os R$ 36 que sua mulher recebe do Bolsa Família. "Eu tento arrumar uns bicos, mas não tem mais emprego. Já estou com as canelas secas de tanto procurar", disse Oliveira. (FG) FONTE: Folha de São Paulo ? SP