Procedimentos não dependem só da vontade dos agricultores, mas dos recursos disponibilizados por Estados e municípios
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Apesar de o número de adesões ter dobrado na atual safra, metade dos agricultores do semi-árido que perderam pelo menos 50% da produção por conta da estiagem ainda não consegue acessar o seguro criado justamente para atendê-los.
Na safra 2007/8, 686,3 mil agricultores, segundo o governo federal, estão inscritos no programa -alta de 98% ante a safra anterior (346,3 mil).
Apesar disso, estimativa da Secretaria da Agricultura Familiar, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, aponta para cerca de outras 715 mil famílias do semi-árido que se encaixam no perfil de atendimento do programa Garantia Safra -com renda per capita de até um salário mínimo e meio (R$ 570) e que tenham perdido na estiagem ao menos metade da produção de arroz, feijão, milho, algodão ou mandioca.
"Trabalhamos com a perspectiva em torno de 1,4 milhão de famílias que poderiam hoje estar participando do programa", diz José Arnaldo Brito, coordenador do programa.
O Garantia Safra atende famílias do Nordeste e das regiões norte de Minas Gerais e do Espírito Santo. Em sua maioria, são arrendatários, meeiros ou posseiros com áreas em torno de um a dois hectares e que produzem, principalmente, milho e feijão para a subsistência familiar.
Uma série de burocracias precisa ser cumprida antes do acesso aos recursos -procedimentos que não dependem só da vontade do agricultor, mas dos recursos disponibilizados por Estados e municípios.
A primeira etapa cabe ao próprio agricultor: pagamento da taxa de R$ 5,50, que representa 1% do valor do seguro. Depois disso, é preciso que a prefeitura do município banque 3% desse valor (R$ 16,50) e, em seguida, o governo do Estado entre com outros 6% (R$ 33). O dinheiro segue ao fundo, no qual a União entra com 20% (R$ 110).
Vencidas essas etapas, a burocracia prossegue. Para acessar o recurso (cinco parcelas de R$ 110), o agricultor precisa ainda que um laudo técnico assinado pelo governo do Estado ratifique a perda de metade de sua produção e que o governo federal reconheça a situação de emergência do município.
Para Antoninho Rovaris, secretário de Política Agrícola da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), Estados e municípios deveriam ser "obrigados" a aderir ao programa, diante de uma demanda dos agricultores. Além disso, o pagamento do seguro não deveria ser atrelado à decretação do estado de emergência no município. "O programa já nasceu burocratizado. Hoje, há uma série de obstáculos ao agricultor", afirma.
Brito admite a burocracia, mas destaca as diferentes responsabilidades. "É um processo pensado em que existe uma co-responsabilidade dos agricultores, dos municípios, dos Estados e do governo federal. Em vez de estar na porta de uma prefeitura esperando uma cesta básica, o agricultor recebe no caixa um dinheiro para aquilo que a família necessita."
No primeiro ano do programa, na safra 2002/3, o seguro foi de R$ 475. A partir de então, está em R$ 550. Por pressão dos próprios agricultores, o governo estuda ampliá-lo na safra 2008/9 -há um limite de R$ 700, imposto pela lei que criou o Garantia Safra. Em 2007, o governo federal reservou R$ 75 milhões para o programa. FONTE: Folha de São Paulo ? SP