No próximo dia 29 de março comemoram-se 10 anos que o Brasil passou a contar com uma legislação de combate o trabalho escravo. A Lei 9.777/98, de minha autoria, passou a ser um instrumento com que a justiça conta, na tentativa de erradicar essa prática milenar de exploração da mão-de-obra dos trabalhadores. Mas precisamos ainda avançar e aprovar leis mais duras que possam dar um golpe nos elos da cadeia que sustenta o trabalho escravo no país, não só como uma questão de justiça, mas, principalmente, como forma de defender os direitos humanos.
Por Paulo Rocha*
O Ministério Público Federal do Pará, por exemplo, depois de analisar vários processos, está atuando contra os chamados "gatos", homens que recrutam as vítimas em Estados como Maranhão, Piauí e Mato Grosso e encaminham para as fazendas de onde são impedidos de sair. Já está caracterizado que existe uma organização criminosa atuando nesse tipo de crime.
Os números são assustadores. Em 2006, foram libertados pelos fiscais do Ministério do Trabalho no Pará mais de mil pessoas submetidas à escravidão em 60 fazendas, o que mantém o Estado no topo da lista desse tipo de crime, com 31,76% dos 3.343 trabalhadores encontrados em todo o país.
No Brasil, os estados mais afetados, além do Pará, são Mato Grosso - que é o segundo na lista do crime - Tocantins e Roraima. A área de maior ocorrência é a do chamado arco do desmatamento, na fronteira entre os estados. Geralmente as pessoas são recrutadas para trabalhar na limpeza do pasto, na pecuária ou no preparo para o plantio da soja. Para tentar inibir essa prática, o Programa Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo criou a "lista suja", que concentra os nomes das propriedades e dos fazendeiros que cometem a irregularidade. Além de tornar público quem são as pessoas que contratam o trabalho escravo, o programa prevê que os fazendeiros incluídos na relação perdem o direito a financiamento de bancos públicos e de alguns privados, que já aderiram ao combate. Também ficam proibidos de participar de licitações com o governo, entre outras ações.
Mas, com toda essa mobilização, o crime continua extrapolando as barreiras da justiça. Por isso, argumentei na Comissão de Trabalho sobre a necessidade de trazer volta esse assunto para o parlamento. Por meio de requerimento, aprovamos a criação da Subcomissão Especial de combate ao trabalho escravo, degradante e infantil. A Subcomissão será mais um mecanismo para a construção de políticas públicas que prevêem punições mais severas contra esse tipo de crime e vai contar com a colaboração do governo federal, dos movimentos sociais e da sociedade como um todo.
A Câmara dos Deputados, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo do Senado Federal estão promovendo o "Ato Nacional Contra o Trabalho Escravo: Aprovação Já!". No próximo dia 12, o auditório Nereu Ramos será um espaço onde, durante todo o dia, milhares de pessoas vão "pressionar" a Câmara a votar em segundo turno a PEC 232/95.
Apresentei essa proposta há 13 anos com o objetivo de retirar a terra das mãos daqueles que a usam para explorar o trabalhador brasileiro. Já aprovada em primeiro turno na Câmara, a PEC trata da expropriação de terras nas quais forem constatadas a prática de trabalho escravo e a sua reversão, assim como os bens nela encontrados, para o programa de reforma agrária. Hoje, essa PEC tramita apensada a PEC 438/2001 do Senado Federal. Iniciativas como essas representaram um alento para uma massa de trabalhadores rurais, principalmente em regiões onde
O Estado parece estar ausente, através das autoridades policiais. O Pará ainda é um dos estados onde esse tipo de prática vem à tona, sendo divulgada amplamente pela imprensa. Mas não se trata de um problema regional. É, antes de tudo, uma vergonha nacional.
* Paulo Rocha (PT-PA) é deputado federal FONTE: Vermelho