Luiz Marinho
Ministro da Previdência Social
No país das grandes e acaloradas paixões, onde muitos se autodenominam especialistas em todas as áreas do conhecimento humano, a divulgação de um parecer técnico, juridicamente complexo, provocou exacerbada e equivocada polêmica que gerou até agressões pessoais. O referido parecer, emitido pela Consultoria Jurídica do Ministério da Previdência Social, por mim aprovado, se limita a reconhecer que a legislação brasileira não exige a titularidade da terra para a caracterização do trabalhador rural como segurado especial. O que a lei impõe, como condição para enquadramento, é que o trabalhador comprove o exercício da atividade de produção rural para ter direito aos benefícios previdenciários. A Consultoria Jurídica, órgão setorial da Advocacia-Geral da União, apenas cumpriu suas atribuições e se respaldou na legislação vigente, sobretudo na Constituição Federal.
Um grave erro de interpretação, no entanto, levou a ilações e a comparações impensáveis e descabidas. Não é verdadeira a alegação, por exemplo, de que qualquer pessoa, seja invasora, posseira ou grileira de terras, tem direito à aposentadoria. Muito menos quem pratica qualquer outro tipo de atividade ilícita. Portanto, sem amparo na legislação previdenciária ou em qualquer outra norma do direito.
A questão analisada pelo ministério limitou-se, única e estritamente, aos direitos e deveres dos brasileiros perante a previdência pública, e o estudo foi elaborado com isenção, responsabilidade e transparência. Foram ouvidos todos os setores envolvidos: a Diretoria de Benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS e a Secretaria de Políticas de Previdência Social.
O exame jurídico seguiu a orientação constitucional em matéria previdenciária (Constituição Federal, art. 194, parágrafo único). Ou seja, promover atendimento universal e igualitário aos trabalhadores. Além disso, destacou que o aspecto da titularidade da terra deve ser tratado no âmbito dos órgãos públicos competentes. A Constituição é clara: a Previdência não pode tratar de forma discriminatória os trabalhadores, urbanos ou rurais. A nossa tarefa é verificar, de maneira isenta, se o cidadão atende aos critérios estabelecidos na lei.
Assim como segue a legislação quando concede benefícios para contribuintes individuais, que exerçam atividades informais, o INSS não pode negar o direito aos que preencham requisitos para enquadramento como segurado especial. Longe de estimular a ocupação de terras ? como afirmaram os desavisados ?, garante o direito do pequeno produtor rural, meeiro, arrendatário, posseiro ou pescador artesanal, caracterizado pelo modo de produção rudimentar, dos que trabalham a terra ou se valem do extrativismo para a própria sobrevivência, a partir de técnicas simples, sozinho ou ao lado da família.
Esse episódio merece reflexão, pois muitos se apressaram a fazer condenação rápida e fácil da Previdência Social, que não teve direito à defesa, na maioria dos casos. Poucos críticos se dispuseram a compreender a realidade dos fatos. Nunca existiu o objetivo de amparar qualquer tipo de ilicitude por parte da Consultoria Jurídica dessa pasta, o que de maneira alguma seria respaldado por mim. A nossa responsabilidade e compromisso é com a garantia dos direitos de cada brasileiro, que procura a Previdência nos momentos de mais fragilidade ? quando está doente, se acidenta ou para requerer a aposentadoria, benefício a que tem direito depois de anos de trabalho e de serviços prestados à comunidade e ao país.
Por fim, é preciso acabar de uma vez por todas no Brasil com o ranço ideológico que leva à cegueira. Os constituintes de 1988 tiveram grande visão quando garantiram, há 20 anos, a aposentadoria dos rurais, contribuindo significativamente para a manutenção do homem no campo e a segurança alimentar da população brasileira. FONTE: O Imparcial ? MA